segunda-feira, 31 de agosto de 2009
domingo, 30 de agosto de 2009
POEMA DE MARIA LÚCIA MARTINS
INTERVALO
------ Maria Lúcia Martins
Intervalo, desistência
– diria ao meu homem – soubesse
marcá-la entre o sexo e sonho,
entre a mulher e a menina.
Todo intervalo é infinito
entre um traço e o que se finda.
Incontáveis cicatrizes,
tempo de gozo e destino.
Qu'alma, sumo e sede de tua
vida, me espelhe, à face clara
de um lago, inda assim, sinto
a desistência no tempo
– tão desvelada – intervalo,
por conquistas de silêncio
e águas do mais profundo.
sábado, 29 de agosto de 2009
JOGO DO TEMPO
_______Habitar o invisível
_______dá em habitar-se.
______João Cabral de Melo Neto
Sou
o que sou:
luto e saudade
de mim.
Sou
eu desamarrado,
pássaro livre,
que sua mão saltou.
Sou pensamento,
sou pouco corpo.
Sou outra verdade
mas, ainda verdade.
Sou contrários:
sou ontem e já não sou,
sou hoje amanhecido.
sexta-feira, 28 de agosto de 2009
quarta-feira, 26 de agosto de 2009
UMA FICCIONISTA

Maria Sampaio
UM POETA

Gerana Damulakis
Quase não, quase nunca
não. Ou sim, ó velho
sim. Nada não se diz, e
sim vai ficando evidente, nada
mais nada menos que ausência
de um canto qualquer pra nos
fazer esse bem danado, esse
bem danado, esse bem
danado.
terça-feira, 25 de agosto de 2009
segunda-feira, 24 de agosto de 2009
domingo, 23 de agosto de 2009
UMA LEMBRANÇA AGRADÁVEL

Mas fiquei recordando que, ao chegar aqui em Salvador, Hélio ligava e íamos jantar, nós três, ou nós quatro, quando Maria Pólvora nos acompanhava. Foram tantos jantares divertidos!
Vou chegar ao ponto: nessa época, indo jantar, falando de literatura, lembro como se agora estivesse vivendo, de uma fala de Hélio sobre Lygia Fagundes Telles: “Para ela, eu estendo tapete vermelho, tiro o chapéu e peço que pise”. Peguei o dito para mim, dando os créditos, claro. Sempre que gosto muito da obra de alguém, reproduzo, dizendo ou escrevendo, que tiro o chapéu, estendo tapete vermelho...
Em tempo: notemos que a frase vem de um grande da literatura, Hélio Pólvora, para outro grande, Lygia Fagundes Telles.
Poucos são os que elogiam seus pares. Conto nos dedos das mãos os que reconhecem o valor do outro. No mais, é muita gente e sua literatura miúda e seu ego enorme, e sua obra pouca e seu lobby imenso...
sábado, 22 de agosto de 2009
sexta-feira, 21 de agosto de 2009
AS DUAS FOTOS
quinta-feira, 20 de agosto de 2009
TOME ASSENTO, TATIANE GONÇALVES
Gerana Damulakis
Tatiane de Oliveira Gonçalves não precisa de apresentação. Ela já vem do volume aplaudido, As borboletas são assim, quando a mestra Maria da Conceição Paranhos, assinando as "orelhas", deixou evidente os méritos da contista. Na ocasião, fiz a resenha do livro de contos de Tatiane para a coluna Olho Crítico, no jornal Tribuna.
Em Das Coisas Invisíveis, peço para Tatiane tomar assento, firmando seu lugar nas nossas letras. Não percam! Já li e assino sobre meu prazer na leitura.
terça-feira, 18 de agosto de 2009
ENCONTROS LITERÁRIOS NA ALB

Os encontros serão realizados no auditório da ALB, de setembro de 2009 a dezembro de 2011, na primeira sexta-feira de cada mês, das 17h às 19h, alternando poesia e ficção, sempre com dois escritores convidados. Haverá ainda dois leitores indicados com antecedência, que irão comentar os textos apresentados, formular perguntas aos dois autores e, assim, iniciar o debate, com a participação ativa do público presente.
Estão programados quatro Encontros para 2009:
– em 4 de setembro, Hélio Pólvora e Mayrant Gallo (ficção), comentários de Antônia Herrera e Gerana Damulakis;
– em 2 de outubro, Ruy Espinheira Filho e Maria Lúcia Martins (poesia), comentários de Lígia Teles e Valdomiro Santana;
– em 6 de novembro, Luís Henrique Dias Tavares e Adelice Souza (ficção), comentários de Cássia Lopes e João Eurico Matta;
– em 4 de dezembro, Myriam Fraga e Ildásio Tavares, (poesia), comentários de Evelina Hoisel e Gustavo Felicíssimo.
domingo, 16 de agosto de 2009
MORANGO E CHOCOLATE NA CHUVA
Então, da janela eu vejo na pele que chove, outra vez. Pingos caíram no quarto. A chuva veio sem avisos e a última janela aberta convidou a chuva para dentro. Molhou a cortina, molhou o papel sobre a cama. O papel sobre a cama atestava um óbito. E o corpo que segurava o papel olhava sem crer. Uma vida inteira resumida naqueles dados exatos. Véspera de acertos burocráticos, que não aguardariam dor nem alegria acomodadas. Até sentir saudade cansava. A vontade de chorar era irritante. Algo que passava do limite. A cada movimento prático, uma evocação. Arrependimento, conversas insuficientes, tantos beijos sonegados. No mapa da história desse amor, eu via agora as inúmeras vezes em que poderia ter diminuído o tom de voz. As inúmeras vezes em que eu poderia ter soltado. Todos os momentos que eu deveria ter acolhido. Vistos em perspectiva, os momentos de ódio, de impaciência, restavam exagerados, desmedidos. Para voltar ao velório, decidi tomar outro milésimo banho. Outra roupa preta, um sapato confortável, grampos no cabelo e um agasalho. Eu sentia um frio desmesurado. Parece que só dentro de mim fazia frio.
Tudo preparado para o Natal. Aquela correria típica não iria atrapalhar os planos de reunir a família. Ele me pediu o carro. Ia buscar um amigo. Estava agitado, há dias. Pela primeira vez, em dez anos, ele iria estar com o pai e a mãe juntos novamente. Foi a luta dele pela reconciliação que nos trouxe de volta ao lar. Então, o Natal seria uma festa verdadeira. O frango desossado estava quente e eu decorava o prato com pedaços de frutas e legumes cortados artisticamente. O interfone tocou e antes de atender tive que limpar a mão cheia de gordura. A cozinha exalava aromas diversos. Eu, inspirada, ouvia um blues e tomava vinho tinto. Que ia regando alguns pratos de carne. André ia passar na casa de Paulo e eles pegariam a torta encomendada com uma semana de antecedência. A torta de morango e chocolate. Algumas pessoas já arrumavam a mesa, ajeitavam os arranjos da árvore. Eu e ele ainda desajustados, trocávamos carinhos disfarçados. O filho havia trazido de volta nosso bem mais precioso. Era uma reaproximação desejada. Tudo agora parecia possível de ser refeito. Móveis novos, lençol novo, a camisola do dia guardada sob o travesseiro. Não sei dizer como tudo começou a desmoronar. Quando percebi, estava alucinada, descendo as escadas. Não havia tempo para esperar o elevador. Acho que estava descalça, acho que era dezembro, talvez eu estivesse com bobs na cabeça, não sei ao certo se cheguei sozinha. Sei que tive um pensamento de louca: que pena, uma torta tão bonita. A torta estava espatifada numa moita, coisas que a gente não entende quando vê um acidente de carro. A cabeça de André pendia e seus cabelos longos se moviam, porque de repente, naquela noite de Natal, o vento chegou trazendo uma chuva e más nóticias.
sábado, 15 de agosto de 2009
TODA MANEIRA DE AMOR VALE AMAR
Paixão... Amor... Amizade... Esse post recém publicado por Gerana, me fez refletir e concluir que toda expressão de sentimento que nos impele à aproximação com o outro, agradavelmente, deve conter um componente amoroso. Seja paixão, amizade, afeto, atração, admiração, em maior ou menor grau implicam em aprovação, que, por sua vez, transitória ou duradoura, intensa ou leve, acaba sendo uma forma de amar.
Não estou incluindo o desejo sexual, o impulso fisiológico que leva à busca da satisfação para uma necessidade natural, instintiva que, por um bonito artifício da natureza, nos impele a procurar justamente as pessoas pelas quais estejamos em estado de aprovação, seja por questão estética, por encantamento, por afeto anterior, por admiração,etc. Então, à necessidade dessa satisfação chamamos amor, o que se torna preciso para que não nos relacionemos intimamente obedecendo ao mero instinto, o que nos reduziria ao comportamento dos animais da escala inferior. Envolta em poesia, a manifestação da libido se torna gentil, linda e enternecedora.
Devo pedir licença aos psicólogos por estar invadindo um terreno no qual não tenho qualquer direito. O que estou dizendo aprendi com eles próprios, concordando por reflexão e atestando por observação.
À parte aquela manifestação amorosa, quero me referir ao amor sentimental, aquele que nos inclina a buscar a companhia de determinadas pessoas e não de outras. É esse amor que acredito estar fragmentado na amizade, na admiração e até na paixão como obsessão que escraviza e leva a extremos. E que alguns afirmam não ser amor, por associarem amor restritamente à finalidade sexual.
Sempre me demoro refletindo em torno dos casos com os quais nos defrontamos todos os dias, ao longo da vida, considerando a variedade de uniões que, no entanto, se me afiguram –e são realmente- outras formas de amar, ou de configurar o amor que a essas pessoas convém. Aqui cabe a pergunta: toda maneira de amor vale a pena? Os conservadores do alto dos seus preconceitos afirmam que não.
Eu não me meto a defender nada de nada. Só observo, reflito e estabeleço a minha opinião.
Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir, casal dos mais famosos, foi ligado durante a vida inteira, morando em apartamentos separados embora próximos, cada um livre para os namoros que lhe aprouvesse, e estavam felizes. Mais perto de nós, porque brasileiros, Bruna Lombardi e Carlos Alberto Riccelli, sob o mesmo teto, vivem um casamento aberto, semelhante ao do casal antes citado. Casais homossexuais masculinos e femininos, todos conhecem às dezenas,cada vez mais frequentes dado o avanço com que a sociedade se conscientizou do respeito pelas diferenças na natureza humana. A imprensa badalou enquanto pode a cláusula do casamento de Jacqueline Kennedy Onassis com o armador grego, pela qual o casal, habitando o mesmo espaço, dormiria em quartos separados e não teria nenhum contato íntimo. Quem não conhece casais que habitam cada qual seu próprio teto, mas mantém o dever de fidelidade recíproca e estão muito felizes? E outros que se amam e se entendem às maravilhas, vivenciando um amor apenas sentimental e respeitando a fidelidade dos casais mais completos?
Embora o mais comum ainda seja a tradicional união, isto é: heterossexual, ambos sob o mesmo teto, ambos comprometidos com fidelidade, é inevitável que aqueles outros aos quais ligeiramente acabo de referir, aí estejam, tendo encontrado sua fórmula de felicidade, aquela que satisfaz, ou a seus interesses, ou a suas conveniências, ou a suas necessidades mais íntimas, e não seriam felizes se tivessem que se enquadrar em um outro formato de vida.
Todos somos diferentes entre nós, ainda que participantes de uma mesma espécie da criação. Ninguém é xerox do próximo, física ou psicologicamente. Quando se encontram duas pessoas que afinam dentro de um novo esquema satisfatório para ambos, acredito que encontraram o mapa da mina, e aposto sinceramente que vivem o sentimento amoroso profundo sem o qual a vida deixa de ter sentido. Não há o certo, não há o errado; há o diferente, há o novo, há a fórmula que cada casal encontra para ser feliz. A partir de que não estejam prejudicando nem a si mesmos nem a outrem, e vivam suas escolhas com dignidade, toda maneira de amor vale a pena, toda maneira de amor vale amar.
quinta-feira, 13 de agosto de 2009
PAIXÃO É..., AMOR É..., AMIZADE É...



A paixão nasce assim, coisa de um instante e, nasceu. É um sentimento arrebatador, que embriaga, que cega. Não é o amor que é cego. Cega é a paixão, estado alucinante, mas, convenhamos, uma delícia. Ainda bem que acaba em tempo, para não enlouquecer o sujeito apaixonado, mas pode se transformar, melhor ainda.
Amor é transformação de algo que existia anteriormente, seja admiração, seja confiança, seja respeito, seja mesmo paixão.
Amizade é o único sentimento que se constrói. Sendo sentimento em permanente construção, são as vivências dos bons e dos maus momentos que conferem o alicerce seguro da amizade, pois que é composição feita tijolo após tijolo. Não há quem obrigue o outro a sentir amizade por quaisquer meios. Sentimento especial, o mais desinteressado e o mais difícil. Uma pedra fora do lugar e fica um edifício feio.
Sem pensar muito, deixando fluir o gosto sem interferência do conhecimento, o romance que retrata a paixão com mais intensidade é Servidão Humana, de Somerset Maugham. O que retrata o amor na sua maior constância ao longo da vida é O amor nos tempos do cólera, de Gabriel García Márquez. E, por fim, a amizade tão bem retratada em Os Três Mosqueteiros, de Alexandre Dumas.
10 ANOS SEM HERBERTO SALES

Em 13 de agosto de 1999 morreu Herberto Sales. Autor de um clássico da literatura brasileira do século XX, o romance Cascalho, Herberto deixou uma obra aplaudida. Dos contos, tantos são antológicos, no sentido que a palavra grega encerra, inesquecíveis. Dos romances, mais de uma dezena, destacam-se o já citado Cascalho, Einstein, O Minigênio, Os Pareceres do Tempo. Ainda: três volumes de memórias, vários de literatura infantil, um volume de literatura infanto-juvenil e um de viagem.
Conheci Herberto Sales na Academia de Letras da Bahia. Ele contou casos engraçados, inclusive um deles ficou na minha memória: ele estava com pneumonia, muito febril e certo de que não passava daquela noite; acendeu, então, uma vela e, com o restante do quarto na escuridão, ficou mirando a vela com olhos pregados, esperando com certo deleite ela - a morte - chegar, assim que a vela apagasse, mas ela não apareceu. Ruy Espinheira Filho seguramente lembrará deste episódio narrado naquele fim de tarde.
Meu texto preferido, escrito por Herberto, é o conto “O Automóvel”. Em texto para palestra na ALB, que depois passou a integrar o volume da Revista da Academia de Letras da Bahia, nº 44, de novembro de 2000, o acadêmico Aramis Ribeiro Costa atenta para uma curiosidade: Maupassant condenava o recurso do acaso na ficção, dizia que não se deve deixar cair uma telha na cabeça de um personagem central. Escreve Aramis: “Herberto, neste 'O Automóvel', ousando contrariar o mestre francês, deixa caírem duas telhas seguidas na cabeça do personagem”.
Realmente o Herberto contista preza na ficção curta o prazer de contar, acima das receitas já confirmadas ou não. Para encontrar o contista Herberto Sales, e dobrar este prazer, vale ler e adentrar tal universo com Ângela Vilma e seu ensaio A Tessitura Humana da Palavra — Herberto Sales, contista. Este volume, que tem o Selo Editorial Letras da Bahia, foi aprovado por Hélio Pólvora, quando fazíamos parte da comissão editorial da FUNCEB, daí que posso testemunhar como todos nós, responsáveis pelas aprovações da Coleção, ficamos encantados com o desenvolvimento do texto ensaístico. Originalmente foi a dissertação de mestrado de Ângela Vilma, mas em livro o que ela apresenta, com sua linguagem sensível para escrever sobre a arte literária, é um texto que suscita imediatamente a vontade de ler e reler Herberto Sales. Ainda agora, reli os capítulos preferidos por Hélio. Conversamos, Aramis e eu, sobre como Ângela Vilma compara os contos “Teoria do Medalhão”, de Machado de Assis e “Teoria do Executivo”, de Herberto Sales. Garanto, o leitor fica tão envolvido, busca os dois contos, e procura compartilhar este prazer acompanhado do livro da ensaísta.
É isso, Herberto, um dia a vela apaga e ela chega mesmo, precisa nos levar. Para alguns, como você, ela não chega completamente (como queria Bandeira naquele poema em que pede para morrer completamente sem sequer deixar um nome). Está escrito na história da literatura brasileira o nome do baiano, imortal da Academia Brasileira de Letras, Herberto Sales.
quarta-feira, 12 de agosto de 2009
PARABÉNS E ALEGRIA PARA LUÍS ANTONIO CAJAZEIRA RAMOS

Mas não gosto de Luís só por conta do episódio: o episódio é ilustrativo. Conheço-o de outros carnavais, há mais de dez anos. Ele escreveu para mim, no exemplar do livro Mais que sempre: “Gerana, a primeira pessoa a reagir com palavra escrita sobre minha palavra escrita. Isto é muito, é sempre, é mais que sempre”. Fiquei tão contente. Ele é teimoso, já escrevi várias vezes, está em tempo de outros indicativos: ele é justo, ele é amigo verdadeiro, não gasta sentimentos à toa. É, lembrei bem, ele é muito justo: sua característica maior.
Seja de Fiat breu, passando por Como se, depois Temporal temporal e Mais que sempre, de Luís Antonio Cajazeira Ramos poderia escolher vários sonetos, mas hoje é dia 12 de agosto, Luís nasceu porque dadas pessoas, lá atrás no tempo, se amaram. A escolha está feita.
AO AMOR
Luís Antonio Cajazeira Ramos
Meus bisavós maternos namoravam
de mãos dadas até já bem velhinhos.
Quando jovens juraram que se amavam,
e a vida nunca mais os viu sozinhos.
Vovó Iaiá e Pai Lulu gostavam
um do outro, tanto, que ninguém sabia,
depois de tanto tempo, se adoravam,
com tanta devoção, Jesus, Maria.
Ele, falante, um bom gourmet, um porto.
Ela, risonha, um bom crochê, conforto.
Ambos, um poema simples, claro e denso.
Não conheci nenhum dos dois. Que pena.
E mesmo assim a vida vale a pena.
Trago em meu sangue seu amor imenso.
terça-feira, 11 de agosto de 2009
ESTE ERA O CARA

domingo, 9 de agosto de 2009
Ó PAI

Cristo
Qualquer dia, qualquer mês
e estou só.
Só as estrias de luz mostram o ar
carregando suas massas de partículas
redondas, tantas quantas são
as pessoas da multidão.
Lá fora é onde deve haver alguém.
Por que tarda?
Estou em plena tarde
sem perder o relógio de vista.
Preciso dizer-te isto, meu Pai,
que já vivo a minha tarde
e tenho medo.
sábado, 8 de agosto de 2009
NOME DE MULHER

sexta-feira, 7 de agosto de 2009
UM LUAR NA NOITE DOS SANTOS REIS

Carregar o estandarte do terno da Sempre-viva era o prestígio máximo. Eu era a prestigiada. Dançar, portando aquele pavilhão dourado, bem à frente do rancho, seguida de todas as meninas adornadas com areia brilhante nas tiaras, e de todos os rapazes vestidos com cetim cor-de-ouro e quepes de paetês, era o meu momento de glória. Não havia cansaço.
O terno saía da Estrada da Rainha às 22 horas em ponto, ao som da banda de Bebeto que nos acompanhava com a estridência do seu piston muito afinado. Subíamos a ladeira da Soledade, e, quando entrávamos no Corredor da Lapinha, já sabíamos que nenhum outro terno da noite dos Santos Reis estaria mais vistoso que o terno da Sempre-viva.
Naquele ano não foi diferente. Mas, naquele ano, Carina tinha cismado que haveria de ser a porta-estandarte. Carina era a filha de seu Heitor, o dono do terno. E era a noiva de Bebeto, um noivado que já tinha perdido a graça, pois o noivo nunca resolvia realizar o casamento. Mas eu era a porta-estandarte desde a organização do terno, e não queria ceder o meu espaço. Carina era miudinha, magrinha, com toda aquela sengracice, ela mal conseguia equilibrar o estandarte na cintura para dançar. Assim, eu continuei sendo a porta-estandarte e Carina continuou desfilando na frente das outras meninas, como sempre.
Aconteceu que desde os ensaios daquele ano, Bebeto e eu vínhamos trocando uns olhares diferentes. Alguma coisa estava se passando entre nós que eu não conseguia controlar, quando Bebeto olhava para mim. O que era aquilo, meu Deus do céu? Eu sempre vira Bebeto andando pela Estrada da Rainha, ou atendendo no balcão da loja de ferragens do pai dele, como se fosse um rapaz qualquer dos que moravam no bairro, mas agora os olhos dele me desconcertavam quando ele fazia um ensaio de sorriso malicioso pelo canto da boca, como se fosse um convite velado. Fomos começando uma cumplicidade sem palavras, mas bastante compreendida por nós dois.
Então chegou o dia 5 de janeiro; era a noite do terno sair, já que a festa da Lapinha acontecia na véspera do dia santo. Minha tiara de areia brilhante ofuscava a vista de quem olhava para mim, e eu ainda espalhara uma porção de brilho pelos cabelos, para ficar ainda mais radiante aos olhos de Bebeto. Porque agora eu já me fazia bonita só para ser apreciada por ele .
O terno saiu da Estrada da Rainha com meia hora de atraso. As meninas estavam animadas e o piston de Bebeto, tocando a marcha- rancho da Sempre-viva causava um frêmito de prazer no corpo inteiro. Sabíamos que o nosso terno era o mais esperado pelo pessoal que freqüentava o largo da Lapinha nos festejos dos Santos Reis. E os aplausos eram sempre muito calorosos, por onde passávamos.
Quando entramos na praça toda embandeirada, por acaso olhei para o céu, e encontrei enorme a lua cheia, bem acima da igreja, brilhando mais do que o Sempre-viva, que as luzes da praça não permitiam que fosse percebida. Como meus olhos sempre encontravam os olhos de Bebeto, mostrei-lhe quanto bela estava a lua. E ele, acompanhando meus olhos para o alto, soltou um pouco o piston para dizer
- Esta lua é nossa. Minha e sua.
Eu me derreti em um sorriso. E ao ritmo do rancho, nos encaminhamos para a frente do presépio armado na fachada da igreja, a dançar em homenagem ao Menino-Deus. Todo o povo ao redor aplaudia alegremente. Cheguei-me mais para perto de Carina e falei
- Vamos fazer uma troca. Eu lhe passo o estandarte.
Ela mostrou um sorriso imenso de contentamento. Tomou o estandarte do Sempre-viva e começou a dançar entusiasmada, como sempre desejara. Supondo tratar-se de uma cena programada, o povo voltou a aplaudir e Carina empolgou-se ainda mais.
Olhei para Bebeto e, depois de me confundir no turbilhão do povo, sai a correr pelo fundo da igreja. Sem demora, Bebeto surgiu, à minha procura, pelo lado oposto ao que eu tomara. Livrei-me das sandálias da fantasia, e, de mãos dadas com ele, nos arriscamos a enfrentar a ladeira São Francisco de Paula, a correr quase deslizando pelas perigosas pedras roliças e escorregadias, para descer até a Cidade Baixa.
Lá embaixo, tudo era só ermo noturno e silêncio. Um solene silêncio de cumplicidade, um silêncio que acolhe e causa medo. As lâmpadas dos postes, de claridade precária, anulavam-se ao brilho do luar, que se estendia na praia como um lençol suave e sugestivo. Aquela lua era nossa. Minha e de Bebeto. Em um abraço, rolamos pela praia, apaixonados.
Lá em cima, Carina estava feliz, realizada, por ostentar o pavilhão dourado do terno Sempre-viva, como sempre desejara, e, com tamanha empolgação, aposto que estaria graciosa.
Uma tiara de areia brilhante e um quepe de paetês confundiram-se, envolvidos pelas primeiras ondas que vieram mansas, na madrugada do dia santo dos Reis, enquanto Bebeto e eu despertávamos para um novo dia. A troca estava feita.
Foto: "Coroando o luar", de Carlos Monte Jr.., retirada do Flickr.
quinta-feira, 6 de agosto de 2009
LISTA DE SCLIAR

Encontrei um recorte da Folha de S. Paulo guardado faz bastante tempo. Trata-se de um texto intitulado "O eterno retorno do conto", assinado por Moacyr Scliar. Claro que seria guardado, é um texto de primeira. No último parágrafo, o contista e romancista, lista os contos que considera significativos, mas atenta que estão excluídos contistas vivos.
Franz Kafka, "Na Colônia Penal" e "Diante da Lei";
Edgar Allan Poe, "O Barril de Amontilado";
Guy de Maupassat, "O Colar de Diamantes";
Vladimir Nabokov,"Visita ao Museu";
James Joyce, "Arábia";
Jorge Luís Borges, "Pierre Menard, Autor do Quixote";
Max Frisch, "Questionnaire";
Júlio Cortázar, "A Casa Tomada" e "A Saúde dos Doentes";
Clarice Lispector, "Uma Galinha";
I. L. Peretz, "E Talvez Mais Alto";
Ernest Hemingway, "Os Assassinos" e mais tantos outros.
Creio que não conseguiria listar contos como fiz com romances, inclusive porque, obviamente, os contos, sendo mais numerosos em dada obra, criam tanta dificuldade na escolha de um único que diga mais de determinado autor, que mostre mais sobre sua capacidade criativa. Sinto tal dificuldade na organização de antologias, há opções e o que levar em consideração? O gosto pessoal ou o que representa melhor o autor?
Foto: Moacyr Scliar, retirada de saolucas.edu.br
quarta-feira, 5 de agosto de 2009
HOMENAGEM DE LUÍS ANTONIO CAJAZEIRA RAMOS

Hoje é quarta-feira, 5 de agosto, falta pouco para as 18h. Nestante eu vinha do trabalho para casa, um ônibus parado à minha frente na sinaleira trazia no vidro traseiro um cartaz da peça "Nhô Guimarães", adaptação do romance de Aleilton, com estreia prevista para o dia 8, sábado, no Teatro do Sesi, no Rio Vermelho, às 20h.
Hoje tem sido um dia muito feliz. De manhã, um e-mail de Aleilton com os originais de um novo livro de contos; um e-mail de Kátia informando sobre sua vitória na seleção de livros para publicação pela Secretaria da Cultura; um e-mail de Zé Inácio dando conta de sua idêntica vitória; novo e-mail de Kátia com a proposta de capa para o livro premiado (cuja apresentação eu assinarei). No meio da tarde, um e-mail de Aleilton com a capa do novo romance, já no prelo, para lançar em setembro, com orelhas assinadas por mim. No final do dia, o cartaz da estreia da peça.
Lembro de outras recentes boas notícias. Os trinta anos de literatura de Gláucia; o recente lançamento do livro de resenhas de Carlos (que tem pronto novo livro de contos, apresentado por Gerana); os originais de um terceiro livro de Kátia (que pode sair pelo selo de Claudius Portugal); eu na coordenação dos "Encontros literários na ALB" (nos quais nosso grupo terá participação efetiva). Enquanto isso, Zé Inácio tocandos seus encontros em Jequié e Maracás; Gerana organizando várias antologias; Gerana e seu blog; Kátia e seu blog; Vivaldo e seu jornal eletrônico mensal. E outras coisas nossas que estão acontecendo e eu não sei.
Nosso encontro em agosto será na festa de meu aniversário, que não ocorrerá no dia do natalício, quarta-feira, 12, e sim na sexta-feira, 14. Será não apenas o grupo, pois a ele acresci muitos convidados para os parabéns (e para os presentes...). Só que o grupo tem avolumado as razões de nossa alegria! Acho que deveríamos fazer uma celebração só nossa. Que tal irmos todos à estreia da peça e realizar um encontro do grupo no bar do Sesi, uma reunião extraordinária?
Quer dizer, nossas reuniões são sempre extraordinárias...
Luís Antonio
terça-feira, 4 de agosto de 2009
POEMA DE MANUEL ANASTÁCIO

FLORES DE PEDRA
Ser estranho à vida, vento, julgaste que era pedra
segunda-feira, 3 de agosto de 2009
sábado, 1 de agosto de 2009
RAPAZ, DE MARIANO CASSAS
Poesia franca, aberta e forte. Mariano Cassas se despe para que se faça a poesia. Sua linguagem tem o efeito do toque, não se passa ileso por esses versos, fica a suave sensação de sentimento que, outrora ferido, agora, sabe-se apreendido.