quarta-feira, 15 de abril de 2009

O SOL QUE A CHUVA APAGOU

Gerana Damulakis

Ao ler um livro eu quero ouvir, ver, eu quero sentir o que estou lendo. Montar as cenas no meu imaginário, enfim. Aramis Ribeiro Costa, ficcionista de longa estrada, diz que isto é o mínimo que se pode esperar de um verdadeiro escritor. Muito bem! Afinal, lembrando Ricardo Piglia, escritor argentino que também levanta a minha admiração, quando disse que o escritor é o resultado de tudo que viu, ouviu e leu, o esperado seria realmente fazer o leitor também ver, ouvir e, creio eu, identificar as influências (ou confluências, como dizia Mario Quintana) do respectivo autor.
Mas acabei enveredando por onde não desejava. Voltando ao desejo inicial, portanto: ao ler O sol que a chuva apagou (P55 Edições, 2009), da Coleção Cartas Bahianas, entrei imediatamente na história de Állex Leilla. E que prazer! A novela conta uma história de amor; melhor, de paixão. Conta o caminho até a sua realização, até o momento da declaração da paixão mútua. O caminho rumo à conquista é sempre mais interessante do que o depois, do que o “morno” da segurança. O leitor vai vibrando, esperançoso, e chega ao final feliz. Deliciosa estranheza! E é aqui que desejo me deter: na estranheza ao ler um final feliz.
Állex Leilla coloca na boca do narrador: “Ainda tem escritor que pensa que o máximo de transgressão é fugir do realismo, da linearidade e abusar de palavrões”. Concordo inteiramente. Outro ponto que criou empatia direta com a minha leitura. A transgressão não está em fazer dos recursos literários bolinhas de malabarismo. E veja quanta transgressão: um narrador gay, totalmente bem resolvido, apenas ainda enlutado pela morte de seu companheiro, e que se apaixona por um dos integrantes de sua banda de rock. A transgressão: não é preciso — não espere — um divã de analista para o narrador, não há conflito quanto à opção sexual, estamos vivendo finalmente o século 21! A transgressão: um final feliz; sim, um final feliz, por que não?
Com sua literatura madura, Állex Leilla pode transgredir assim. A linguagem é perfeita para conseguir aquilo que eu dizia acima: fazer o leitor ver, ouvir e sentir. Repito: isto é de uma escritora com mão madura, segura, que não está chegando; já chegou.

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