
Ildásio Tavares
A 29 de setembro próximo passado comemorou-se o centenário deste que é um dos grandes escritores da língua portuguesa e, sem dúvida, o seu maior ficcionista. Joaquim Maria Machado de Assis, pobre, mulato, epiléptico, filho de uma lavadeira do Morro do Livramento, é um excelente exemplo da capacidade do ser humano de ultrapassar as suas contingências e subir ao primeiro escalão da espécie humana. Entre outras coisas, fundou a Academia Brasileira de Letras para onde arregimentou a fina flor da inteligência brasileira de sua época que aceitou sua liderança de olhos fechados.
É, inclusive, um tapa de luva na cara dos racistas que um afro-descendente, não só tivesse o respeito e a admiração de todos escritores do seu tempo, mas também que o estilo de narrar de Machado de Assis estivesse longe de identificar-se com uma África selvagem e primitiva. Ele é dos nossos escritores o que melhor esgrimiu a finura, a classe e a sutileza, além de ser um profundo mergulhador no mar desconhecido da alma humana de onde nos trouxe perfis imortais. Não será ocioso repetir como o jogo de ambigüidade no romance Dom Casmurro criou uma dúvida eternamente insolúvel a respeito da honestidade conjugal de Capitu.
Esta ambigüidade é conseguida pura e simplesmente pela sofisticação narrativa. através do ponto de vista do narrador implicado Bentinho que é a única testemunha que nos relata a maneira de agir de sua mulher, uma personagem que vem sendo construída por ele em flash-back, até que culmina com a acusação, que ele procura comprovar para o leitor, a fim de justificar a própria crueldade com sua mulher. Afinal, não há nenhuma certeza, e até um júri já foi feito para decidir se Capitu traiu ou não traiu. Como um verdadeiro bruxo da narrativa, Machado se limita a expor as peças do quebra-cabeça e deixar para o leitor a tarefa de armá-lo.
Se grande romancista, Machado não foi menor no conto e na poesia. Alguns de seus contos ou novelas são antológicos, são leituras obrigatórias tendo encantado as gerações. "Missa do Galo" é um conto cuja linguagem poderíamos apontar como calcada numa atmosfera. em que a sutileza, e os entretons governam a ficção machadiana e não podemos arriscar um palpite sobre o comportamento feminino, este enigma que Machado gostava de construir. Em "O Alienista" temos um fantástico estudo psicopatológico da natureza humana raiando ao absurdo em que o personagem principal é a loucura humana. Outro conto magistral e que todos deviam ler é "O Espelho".
Um dos primeiros cultores deste gênero tão difícil no Brasil, Machado escandiu a narrativa curta com um primoroso tratamento de linguagem, uma prosa castiça, ritmada e de excelente seleção vocabular que superava o gênio português Eça de Queiroz.
A crônica machadiana é essencialmente leve e requintada e nela, ele consegue uma dualidade difícil: captar o sentimento de seu tempo e fazê-lo atravessar o tempo.
É, inclusive, um tapa de luva na cara dos racistas que um afro-descendente, não só tivesse o respeito e a admiração de todos escritores do seu tempo, mas também que o estilo de narrar de Machado de Assis estivesse longe de identificar-se com uma África selvagem e primitiva. Ele é dos nossos escritores o que melhor esgrimiu a finura, a classe e a sutileza, além de ser um profundo mergulhador no mar desconhecido da alma humana de onde nos trouxe perfis imortais. Não será ocioso repetir como o jogo de ambigüidade no romance Dom Casmurro criou uma dúvida eternamente insolúvel a respeito da honestidade conjugal de Capitu.
Esta ambigüidade é conseguida pura e simplesmente pela sofisticação narrativa. através do ponto de vista do narrador implicado Bentinho que é a única testemunha que nos relata a maneira de agir de sua mulher, uma personagem que vem sendo construída por ele em flash-back, até que culmina com a acusação, que ele procura comprovar para o leitor, a fim de justificar a própria crueldade com sua mulher. Afinal, não há nenhuma certeza, e até um júri já foi feito para decidir se Capitu traiu ou não traiu. Como um verdadeiro bruxo da narrativa, Machado se limita a expor as peças do quebra-cabeça e deixar para o leitor a tarefa de armá-lo.
Se grande romancista, Machado não foi menor no conto e na poesia. Alguns de seus contos ou novelas são antológicos, são leituras obrigatórias tendo encantado as gerações. "Missa do Galo" é um conto cuja linguagem poderíamos apontar como calcada numa atmosfera. em que a sutileza, e os entretons governam a ficção machadiana e não podemos arriscar um palpite sobre o comportamento feminino, este enigma que Machado gostava de construir. Em "O Alienista" temos um fantástico estudo psicopatológico da natureza humana raiando ao absurdo em que o personagem principal é a loucura humana. Outro conto magistral e que todos deviam ler é "O Espelho".
Um dos primeiros cultores deste gênero tão difícil no Brasil, Machado escandiu a narrativa curta com um primoroso tratamento de linguagem, uma prosa castiça, ritmada e de excelente seleção vocabular que superava o gênio português Eça de Queiroz.
A crônica machadiana é essencialmente leve e requintada e nela, ele consegue uma dualidade difícil: captar o sentimento de seu tempo e fazê-lo atravessar o tempo.
Para mim, de grande beleza, com a incrível capacidade de unir pensamento e sentimento, é, sobretudo sua poesia.
Ildásio Tavares assina mais de 10 títulos como poeta, mas tem romances, contos, ensaios e é compositor. Foto "Cem anos", de ailana09, retirada do Flickr.