
HELENA
-------------Myriam Fraga
Ele estava parado
À entrada da sala.
Olhos postos no chão,
Os pés unidos,
E a seda da túnica
Flutuando
Sobre o torso flexível.
Das sandálias de couro
Alongavam-se as pernas
Como mastros de um navio.
Tanta beleza, meu Deus!
Em mim cavou-se o abismo.
Recuaram, como onda na praia,
Os artifícios
Que ainda me mantinham,
E o precipício
Atraiu-me com um som
Claro de sinos.
Deixei para trás o lar,
O marido e os filhos,
A chama da lareira
Mudou-se em pedra fria.
Mas a deusa foi cruel.
Cada beijo de amor
Transformava-se em crime,
Por cada instante de paixão
Cobrava-se o dízimo.
Tróia foi apenas um sonho.
Resta a sombra do cavalo,
Como uma estátua,
Na praça.
Restam ruínas, destroços...
A morte no meu leito
E o vingador à porta.
in Poesia Reunida (Salvador: Assembléia Legislativa do Estado da Bahia, 2008).