Ildásio Tavares fez Letras na UFBA, Mestrado na Southern Illinois University, Doutorado na UFRJ, Pós-Doutorado na Universidade de Lisboa. Era poeta, ficcionista, cronista, tradutor, compositor, especialista em Ernest Hemingway e em Camões. Um de seus títulos - são tantos - é O Domador de Mulheres (Imago Editora, 2003). Tenho sempre perto de mim o volume 50 poemas escolhidos pelo autor (Edições Galo Branco, 2006). É desta reunião citada que retirei o poema abaixo.
RESTOS
------Ildásio Tavares
Há um resto de noite pela rua
Que se dissolve em bruma e madrugada.
Há um resto de tédio inevitável
Que se evola na tênue antemanhã.
Há um resto de sonho em cada passo
Que antes de ser se foi, já não existe.
Há um resto de ontem nas calçadas
Que foi dia de festa e fantasia.
Há um resto de mim em toda parte
Que nunca pude ser inteiramente.
RESTOS
------Ildásio Tavares
Há um resto de noite pela rua
Que se dissolve em bruma e madrugada.
Há um resto de tédio inevitável
Que se evola na tênue antemanhã.
Há um resto de sonho em cada passo
Que antes de ser se foi, já não existe.
Há um resto de ontem nas calçadas
Que foi dia de festa e fantasia.
Há um resto de mim em toda parte
Que nunca pude ser inteiramente.
36 comentários:
Que poema, Gerana. Também fiquei sem palavras. beijo grande.
Eu Lia Ildasio Tavares.
Uma pena.
Um abraço
Que triste notícia! Sempre gostei muito da poesia de Ildásio, e esse poema bem ilustra a grandeza dela. E aquele outro poema que ele fez, dedicado a você? Belo demais.
não há o que dizer, apenas sentir
abraço
A morte é grave e difícil. Adeus, Ildásio. Gerana, já foi divulgada a data, hora e lugar do sepultamento?
É pelas piores razões que estou agora a ler os seus poemas. E é assim, na mais sincera homenagem que a um poeta se pode fazer, que vou sentindo, em cada verso, o diálogo, até agora possível, trancado no exílio do poeta em si próprio, tal como, um dia, foi cantado por Ildásio.
Lúcia Delorme: ainda não sei, mas logo serei avisada.
aero: tenho, em papel, as 8 modificações do poema que Ildásio me dedicou, Réstia de Luz. Aliás, ele me dedicou justamente porque ouvi modificação por modificação.
Este poema está no livro 50 Poemas Escolhidos pelo Autor (Ildásio Tavares - Rio de Janeiro: Edições Galo Branco, 2006).
RÉSTIA DE LUZ
Ildásio Tavares
Para Gerana
Ainda ontem, entrei sem querer
naquela
pensão barata (mas limpa e asseada)
onde nos encontrávamos felizes nos
finais de tarde. Entrei sem querer,
eu juro. Procurava uma peça de carro
numa daquelas lojas perto da estação
e quando dei por mim, estava bem na porta.
Resistir, quem havia de?
Na penumbra furtiva do corredor,
o coração descarrilou até o quarto
17 que me aguardava calado como uma
verdade eterna. Tudo igual. A cama
imaculadamente branca; um criado mudo;
duas cadeiras de palhinha puídas; e a
bacia de louça cor de rosa em que te lavavas depois,
ocultando teu gesto,constrangida,
para não te banalizares – tua aura de
deusa profanada por uma intimidade prosaica.
Quanta vez este teu recato ante a promiscuidade
me excitou, te enlacei por detrás
e te trouxe de volta ao vendaval da cama!
Tu sempre resistias. Você é louco, menino? Ele chega
cedo do trabalho. Olhe aquela réstia de luz na persiana
que engatinha sorrateira a caminho da noite. Mas
resistias um resistir indeciso, querendo mesmo te
entregar, e desta vez com mais volúpia.
É um amor bem mais amor esse amor
que me fazes depois, tu murmuraste
um dia, abaixando os olhos, com esse
teu jeito envergonhado e tímido de
tudo fazer e nada comentar. Foi num desses dias em que
sentimos a terra tremer embaixo de nós e até pensamos
que era o trem. La estava a réstia de luz que engatinhava
pela persiana, prestes a engendrar a noite.
Não sei se foi ele, se fui eu ou que foi.
Ninguém entende a lógica das mulheres.
Faz bastante tempo que nos vimos.
Foi no meio da rua, por acaso. Tu nem
quiseste sentar para tomar alguma coisa, conversar.
Era um final de tarde. Tinhas pressa.
O que a gente tem pra conversar,
conversa aqui mesmo, rapaz, diga.
Eu tentei reviver em minhas trôpegas palavras
nossos momentos de esplendor, cerzir retalhos do passado
como uma colcha de delírio.
Tu ouviste calada e no final
disseste. Acabou, menino, passou, esqueça.
Com um sorriso didático e nada teu.
Com um ar preocupado, consultaste
teu relógio e foste embora, sem um adeus,
pisando nas nuvens num passo curto
e ligeiro. Eu via uma pessoa mas era outra
pessoa. No quarto imóvel da
pensão barata, a réstia de luz desenhava
preguiçosamente as horas diminutas do
final da tarde, recorrente indiferença
de todos os dias. Sinete azul da eternidade.
Gerana e demais,
Meu pai deixou de ser mundano e passou a ser eterno. Se puder, dê uma lida no artigo que fiz homenageando ele:
http://teatronu.blogspot.com/2010/10/meu-pai-subiu-no-telhado.html
um carinhoso abraço,
GVT.
Apaguei meus comentários anteriores porque não acertei me expressar. Ildásio foi meu mestre, um grande poeta. O que dizer? Falta enorme nas letras baianas.
Maria de Fátima
Gil Vicente: sinto muitíssimo. A tristeza é grande.
Sinto muito quando um poeta assim nos falta.
Belo poema,Réstia de luz.
Um abraço, Gerana.
Querida G, lindo lindo poema.
Um abraço apertado.
BF
Poema simplesmente maravilhoso!
Lamentável o passamento do grande escritor.
Grande perda!
Abraço apertdo, minha amiga Gerana.
As palavras se recolhem em horas assim.Mas há aqui a beleza de um poema, e o poeta é imortal.
grande abraço, Gerana
Gerana,
Lamento.
Só o conhecia de ouvir falar.
Esse poema que ele te dedicou; "Réstia de Luz" tem uma carga emotiva rara de se encontrar na poesia atual.
Ele não é escrito, é chorado.
JR.
Fico triste com a notícia.
A você,que conserva tamanha amizade por ele, meu abraço.
Muito bem escolhido o poema para homenageá-lo. Afinal, o escritor sempre estará em toda parte, onde quer que alguém o esteja lendo.
O poema é fabuloso, mas nunca tinha lido nada do autor.
Que a sua alma descanse em paz, porque a sua obra, por certo, o manterá com vida.
Beijos, querida amiga.
Vc sempre declarou teu encanto por ele. Meu abraço!
oh, Gerana,
perdemos...
Triste notícia.
Belo poema, bela homenagem.
A sensibilidade de Ildásio chega a destoar do homem estabanado que ele sempre foi. Já tinha lido este poema e, como sempre, louvado o poeta que ele era. Se foi, porque no dia certo todos se vão. Que Deus o tenha em paz.
no tengo palabras.
sólo leo y releo el poema de la entrada y el que te dedicó.
un fuerte abrazo*
'Arretado de bom', como vcs dizem, esse poema. Perfeito.
Eu me esqueci de dizer, maravilhosas as outras (mais recentes) postagens): Whitman, Florbela, Sophia, Voltaire. Beleza o teu blog. Um abraço.
Lembrando Fernando Pessoa: "A morte é a curva na estrada, morrer é não mais ser visto". Fica a lembrança da pessoa, o seu rastro pelo chão, a palavra....
Fui aluno dele na UFBA e gostava tanto do jeito estabanado, como disse Gláucia, como do poeta. Uma grande perda.
Gracias por descubrirme a este poeta.
Ya aparece en mi blog con sus versos.
http://papelmarelo.blogspot.com/
Un abrazo
tenho um cd com poemas dele, narrados por ele mesmo, fui ao lançamento, na minha úlitma entrevista no blog Literatura Clandestina falei dele, perda que a eternidade ganha
Acho que sem palavras você sempre diz muito.
E seu cuidado, sua atenção é sempre necessária. Você protege, mesmo sendo sincera e direta. Você acolhe. E o gesto de homenagear Ildázio reafirma isso.
Sorte dele.
Belo poema, Gerana! Sempre ficam restos pelo caminho. Os poetas, no entanto, permanecem por inteiro. Lindo!
As pessoas são sempre únicas e irrepetíveis. De Ildásio fica muitooo... E até a ausência se faz repleta de presença em forma de palavras, lirismo..., enfim, da imortal mágica literária!
São mais que lindos os poemas dele!
Abç
GERANA,
ILDÁSIO É O MEU POETA AMADO. ASSIM O CHAMAVA.CALOU A SUA POÉTICA. CONTINUA AQUI NO MEU CORAÇÃO COMO O AMADO POETA AMIGO.
RESTOS QUE ESCREVERA NA JUVENTUDE É ETERNO.
UMA SAUDADE. UMA FALTA. UMA PRESENÇA ETERNA NA MINHA MEMÓRIA AFETIVA. PARTICIPEI DA MISSA DA ESPERANÇA NA PARÓQUIA DA VITÓRIA.
DEUS O GUARDE EM SUAS MÃOS.
BJ
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