sábado, 10 de novembro de 2007

TUDO QUE VOCÊ NÃO SOUBE


Tanto os escritores quanto os leitores vão adquirindo certos preconceitos como, por exemplo, não admirar outros escritores da mesma idade, região ou gênero, sequer lê-los porque não se pode perder tempo lendo o que os contemporâneos escrevem quando há muito clássico para “reler”. Se o escritor estiver na mídia, aí o nariz e a boca se contorcem e estará decidido que nada haverá de bom naquelas linhas escritas por fulano, seguramente. O mesmo se passa em qualquer área, é lugar-comum, humano demasiado humano. Imaginem o que dizem os oncologistas sobre seus colegas que exercem a medicina aplicando botox nas dondocas: simplesmente, para os primeiros os demais não são médicos. Quando se sabe, na verdade, que não é bem assim, há de haver de tudo, inclusive o que é fruto de preconceito.
Vamos fazer a leitura da escritora que está na mídia: Fernanda Young e seu sétimo romance, Tudo que você não soube (Ediouro, 2007). Primeiramente, vale lembrar que ela foi roteirista das séries Os Normais e A Comédia da Vida Privada, e que tem um programa no canal fechado, GNT, chamado Irritando Fernanda Young. Enfim, uma escritora inteiramente dentro da mídia. E ela faz questão de repetir que são romances o que sabe fazer melhor.
Afastando os tais preconceitos, nem que seja para ler apenas o primeiro capítulo, logo se dará o encantamento com o texto. A narrativa é uma catarse feita por uma filha para seu pai moribundo. Por vezes o tom é pesado, pois pesadas são a rejeição e a solidão que permearam uma infância sinônima de abandono afetivo. A capa do livro traz um martelo em relevo. É com ele que a narradora agride a mãe na adolescência, mas tudo que escreve para o pai não se quer como justificativa de atos passados, o desejo é o de verbalizar a mágoa. Imediatamente vem uma lembrança: o livro Carta ao pai de Franz Kafka, embora aqui haja um fundamento existencial concreto. O interessante é que Fernanda Young procura levar o leitor em outra direção, como quando escreve; “Caso fosse uma escritora, mesmo, deixaria que você morresse, antes, para poder me esbaldar nessas velhas lembranças; talvez transformando-as em patéticos biscoitinhos amanteigados num pratinho, como fez a bicha chata do Proust”. De resto, não deixa de estar presente o humor de Fernanda.
O mais incrível é que, embora pareça haver um esforço desmedido em certos momentos para que o leitor se assuste com tanto desamor, o relato acaba passando uma sensação incontestável: seja ódio, seja amor, há um sentimento muito intenso, por isso o romance consegue que o leitor se envolva com a narradora em algum ponto. Se houvesse indiferença e superação, a história não teria logrado êxito. Para além de preconceitos, portanto, é hora de saber Tudo que você não soube.

Gerana Damulakis

6 comentários:

Kátia Borges disse...

Oi, Gerana, concordo com você em relação ao preconceito contra autores contemporâneos, principalmente aqueles que dominam a chamada grande mídia, caso de Fernanda Young. Outro dia li um texto de Ivana Arruda Leite, no qual ela dava uma bela esnobada em Young. Então, o preconceito rola também entre os pares. Bjs

A.Pedro disse...

testando

Anônimo disse...

testando2

Anônimo disse...

testando3

Arthur Araujo disse...

Li o tal livro por duas vezes e posso dizer com uma falsa segurança: o livro é impregnado de uma tristeza fermentada pelo ódio do des-amor. Penso que a narradora é tão insegura que precisa se justificar ao longo de cento e tantas páginas para provar ao pai e a si mesma que não é apenas um monte de merda. O livro provoca intensas reflexões sobre variados assuntos e merece ser lido com atenção especial.

A.

Anônimo disse...

Ler este livro justamente no Dia dos Pais é dose. E é justamente isto que estou fazendo. À sádica narradora, uma leitora masoquista.