sábado, 20 de fevereiro de 2010

UMA NOITE E UMA CARTA DE AMOR



Cidade do México, 12 de setembro de 1939.

Minha noite é como um grande coração batendo. São três e meia da madrugada. Minha noite é sem lua. Minha noite tem olhos grandes que olham fixamente uma luz cinzenta filtrar-se pelas janelas. Minha noite chora e o travesseiro fica úmido e frio. Minha noite é longa, muito longa, e parece estender-se a um fim incerto. Minha noite me precipita na ausência sua.

(...)

São quatro e meia da madrugada.

Minha noite me esgota. Ela sabe muito bem que você me faz falta e toda a escuridão não basta para esconder essa evidência. Essa evidência brilha como uma lâmina no escuro. Minha noite quer ter asas para voar até onde você está, envolvê-lo no seu sono e trazê-lo até onde estou. (...)

Minha noite pergunta a si mesma se meu dia não se parece com minha noite. (...)

Minha noite quer que você repouse no meu ombro e que eu repouse no seu. Minha noite quer ser voyeur do seu gozo e do meu, ver você e me ver estremecer de prazer. Minha noite quer ver nossos olhares e ter nossos olhares cheios de desejo. Minha noite é longa, muito longa.(...)

Você me faz tanta falta, tanta. E suas palavras. E sua cor.

Logo o dia vai raiar.

De Frida Kahlo a Diego Rivera em Cartas do Coração - Uma antologia do amor (Rocco, 1999), organização de Elisabeth Orsini.

Ilustração: Diego y yo, de Frida Kahlo, 1949.

20 comentários:

BAR DO BARDO disse...

Frida, Kahlo-me!

A Itinerante - Neiva disse...

Ai que lindo! Não sabia que ela escrevia tão bem quanto pintava. Artista é artista da forma que escolha para se expressar.

Anônimo disse...

Adoro quase tudo daqui e agora fui surpreendida com outra figura que adoro, a Frida... mas do que tudo, gosto mesmo é de ver o México tão presente e vivo nos autorretratos da Frida, seja nas cores, seja nas representações culturais sutilmente presentes... o feminino daquela cultura tão rica em expressividade trágica, quase, tal qual a violência da colonização... parabéns pelo blog. MB

Lisarda disse...

Frida,uma cerva ferida.Quem dá muito, pide tudo.

Germano Viana Xavier disse...

Gerana,

obrigado pela presença constante em meu blog. Estou morando em Salvador agora, na tua terra. Teu recanto é de palavras bebíveis.Quero ver a continuação do conto a que você fez citação no texto passado.

Abraço forte.
Continuemos...

Pena disse...

Linda e Simpática Amiga:
Uma viagem extraordinária e doce pelo seu valioso interior.
Excelente.
Tem uma sensibilidade de ternura, perfeição e encanto.
Parabéns, pela fabulosa narração.
MUITO OBRIGADO pela amabilidade da sua visita.
Beijinhos amigos.
No maior respeito e consideração.
Bem-Haja, fantástica amiga.
Sempre a admirá-la.
MUITO OBRIGADO.

pena

Tem um valor de ouro puro.

Ana Tapadas disse...

A extraordinária Frida K.! Admirável e trágica, como toda a sua vida.
Ai Gerana que saudades já tinha! Lá deixei os espanhóis mergulhados em frio e orgulho.
beijinho

Anônimo disse...

Olá, antes de mais nada, parabéns pelo blog!
E por acha-lo de muito bom gosto é que o/a convido a vir conhecer a proposta do meu Blog para você.

Aguado sua visita!
Forte abraço!

Karina

nydia bonetti disse...

E Frida dizia que não pintava sonhos, só realidade. Pra mim, ela era toda coração - assim como as cartas. Beijo, Gerana, bom domingo!

Bípede Falante disse...

Tenho esse livro e também o diário. Ambos impressionantes como os quadros dela.

Fernando Campanella disse...

Assisti ao filme sobre a vida de Frida, apaixonante, assim como sua obra.
Suas cartas são uma prosa poética.
Um abraço.

João Renato disse...

Olá, Gerana,
Acho que Frida vivia além dos limites sempre. E queimava as pontes. Era sempre radical (e isso tem um preço alto).
Abraço,
JR.

Unknown disse...

O amor entre tantas idas e vindas sempre permaneceu em Frida e Diego. A cada separação parece que a paixão mais se avolumava. Este livro, organizado por Beth Orsini, nos revela surpresas de arrebatamento amoroso em pessoas insuspeitáveis. É avassaladora a carta de Graciliano à Heloisa. Abraço.

Bernardo Guimarães disse...

que homem não gostaria de estar no lugar de diego naquele momento ao ler a carta, a saber da noite do seu amor?
em tempo: brigado pela oferta da garagem mas lá não pretendo mais voltar ( ao carnaval)

Jefferson Bessa disse...

Lindos trechos de carta, Gerana! O amor de Frida por Rivera foi muito intenso mesmo.
Ressalto a bela escolha da pintura que fez: Rivera constantemente nos pensamentos da artista. Ficou lindo! ;-)

beijos.

Jefferson

Heli disse...

Que linda postagem!!! Não sabia que Frida fazia poesia também com palavras!

glaucia lemos disse...

Grande Frieda! E ele era tão insensível a tanto sentimento!

Edu O. disse...

Quando eu estava na Escola de Belas-UFBA, Frida era uma das minhas maiores referências e continua sendo ainda aqui fora.

Bárbara Jolie 1 disse...

Que intensidade, que força, que mulher! Adorei

Anônimo disse...

Gerana, ufa, consegui vir te visitar. Sabe, não conhecia essas cartas, mas conheço a história sofrida dessa mulher. Seus delírios, suas viagens dentro do escuro e da luz.
Me impressionou a dor e a melancolia dessa entrega a um homem...que sofrimento!