terça-feira, 12 de maio de 2009

A LEITORA


Gerana Damulakis


Os livros tomam conta de mim. Disto não são capazes o cinema, a música, certos assuntos... Ao acabar um livro, há sempre uma sensação, independente de ter levantando ou não a minha admiração pelo estilo, pela linguagem, pela originalidade do tema, pela peripécia bem urdida. É da sensação que persiste que quero escrever. Ela independente do final do texto – geralmente, o final importa tão pouco, é o que menos deixa resquícios na memória. Vou formando as minhas imagens, diretora que sou da minha leitura – a leitora, a que completa o texto. Quantas vezes pouso o livro e vou beber água (sou viciada em água, H2O mesmo) e sinto que a atmosfera do livro me acompanha. Isto é chamado de teoria do efeito. Wolfgang Iser discorre em O ato da leitura (Editora 34, 1996) a teoria do efeito estético. Tal efeito requer do leitor atividades imaginativas e perceptivas, diz ele (são as imagens criadas). O que é tratado é o efeito e não a recepção. Veja que interessante: o texto, o leitor e sua interação – desta relação dialética o efeito estético deve ser analisado. Iser: “Uma teoria do efeito está ancorada no texto – uma teoria da recepção está ancorada nos juízos históricos dos leitores”.
Como eu sou prolixa! Queria dizer da sensação arrebatadora de um livro que acabei de ler faz pouco tempo: Aqui nos encontramos, de John Berger. Narrativa que engana, começando de uma forma simples para logo jogar o leitor numa vertiginosa andança sem tempo. Basta esta frase da mãe do narrador: “Os mortos não ficam onde estão enterrados”. Depois de tudo, pensei que, escrevendo aqui, ficaria mais claro o que estou sentindo. Não adiantou e, caso eu não pare agora, temo que farei uma resenha do livro e não uma busca para definir a sensação.
Sairei do livro em questão. A literatura é uma grande escapatória, sempre digo. Quem tem, no ato da leitura, este imenso prazer, não sente solidão, consegue viajar sem sair do lugar (frase que já é um lugar-comum), mas, principalmente, sente a vida em dobro. Porque ele, o livro, nos toma, cresce e oferece a oportunidade de sentimentos diversos, tão distintos da experiência que se está tendo no cotidiano.
E para encerrar porque hoje não estou boa de texto, por conta disso, peço ajuda. Que diga bem, então, o grande Guimarães Rosa sobre o assunto: “Às vezes, quase sempre, um livro é maior que a gente”, in Grande sertão: veredas.


Tela de Edward Hopper [ Compartment C, Car 193], 1938. Retirei do maravilhoso blog: www.osilenciodoslivros.blogspot.com/

4 comentários:

gláucia lemos disse...

É verdade, o livro é maior que a gente, e ganha muito o autor que tem humildade para reconhecer que a sua criação, a despeito de ser "sua criação", torna-se tão maior, que ele não entende como foi seu criador.Fui eu quem o fez?
Este o mistério insondável do dom de criar, sua inexplicabilidade. Deus louvado!

pereira disse...

Gláucia já disse tudo. D. Gláucia, assim te chamei como chamamos alguém com o intuito de fazer graça. Assim, por exemplo: "D. Gláucia, D. Gláucia". Já nos entendemos faz tempo através da literatura, Gláucia. Não seria agora que te trataria com cerimônia, não é?

Katia Borges disse...

O livro meio que se solta do criador e anda com suas próprias pernas. Às vezes, some e nem dá notícias.

glaucia lemos disse...

Ah Pereira, nem pensei que seria cerimônia, achei que o D. Gláucia, seria uma maneira de dar um tratamento de distinçao, por ter gostado do texto, tipo: "Você fez um Senhor Trabalho!" Fiquei lisonjeada. Claro que nos entendemos através da literatura, e a internet tem este grande atributo, o de reunir em clans os que se identificam por algum liame, no nosso caso, a literatura,assim fazemos novos valorosos amigos.