sábado, 15 de agosto de 2009

TODA MANEIRA DE AMOR VALE AMAR

Gláucia Lemos

Paixão... Amor... Amizade... Esse post recém publicado por Gerana, me fez refletir e concluir que toda expressão de sentimento que nos impele à aproximação com o outro, agradavelmente, deve conter um componente amoroso. Seja paixão, amizade, afeto, atração, admiração, em maior ou menor grau implicam em aprovação, que, por sua vez, transitória ou duradoura, intensa ou leve, acaba sendo uma forma de amar.
Não estou incluindo o desejo sexual, o impulso fisiológico que leva à busca da satisfação para uma necessidade natural, instintiva que, por um bonito artifício da natureza, nos impele a procurar justamente as pessoas pelas quais estejamos em estado de aprovação, seja por questão estética, por encantamento, por afeto anterior, por admiração,etc. Então, à necessidade dessa satisfação chamamos amor, o que se torna preciso para que não nos relacionemos intimamente obedecendo ao mero instinto, o que nos reduziria ao comportamento dos animais da escala inferior. Envolta em poesia, a manifestação da libido se torna gentil, linda e enternecedora.
Devo pedir licença aos psicólogos por estar invadindo um terreno no qual não tenho qualquer direito. O que estou dizendo aprendi com eles próprios, concordando por reflexão e atestando por observação.
À parte aquela manifestação amorosa, quero me referir ao amor sentimental, aquele que nos inclina a buscar a companhia de determinadas pessoas e não de outras. É esse amor que acredito estar fragmentado na amizade, na admiração e até na paixão como obsessão que escraviza e leva a extremos. E que alguns afirmam não ser amor, por associarem amor restritamente à finalidade sexual.
Sempre me demoro refletindo em torno dos casos com os quais nos defrontamos todos os dias, ao longo da vida, considerando a variedade de uniões que, no entanto, se me afiguram –e são realmente- outras formas de amar, ou de configurar o amor que a essas pessoas convém. Aqui cabe a pergunta: toda maneira de amor vale a pena? Os conservadores do alto dos seus preconceitos afirmam que não.
Eu não me meto a defender nada de nada. Só observo, reflito e estabeleço a minha opinião.
Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir, casal dos mais famosos, foi ligado durante a vida inteira, morando em apartamentos separados embora próximos, cada um livre para os namoros que lhe aprouvesse, e estavam felizes. Mais perto de nós, porque brasileiros, Bruna Lombardi e Carlos Alberto Riccelli, sob o mesmo teto, vivem um casamento aberto, semelhante ao do casal antes citado. Casais homossexuais masculinos e femininos, todos conhecem às dezenas,cada vez mais frequentes dado o avanço com que a sociedade se conscientizou do respeito pelas diferenças na natureza humana. A imprensa badalou enquanto pode a cláusula do casamento de Jacqueline Kennedy Onassis com o armador grego, pela qual o casal, habitando o mesmo espaço, dormiria em quartos separados e não teria nenhum contato íntimo. Quem não conhece casais que habitam cada qual seu próprio teto, mas mantém o dever de fidelidade recíproca e estão muito felizes? E outros que se amam e se entendem às maravilhas, vivenciando um amor apenas sentimental e respeitando a fidelidade dos casais mais completos?
Embora o mais comum ainda seja a tradicional união, isto é: heterossexual, ambos sob o mesmo teto, ambos comprometidos com fidelidade, é inevitável que aqueles outros aos quais ligeiramente acabo de referir, aí estejam, tendo encontrado sua fórmula de felicidade, aquela que satisfaz, ou a seus interesses, ou a suas conveniências, ou a suas necessidades mais íntimas, e não seriam felizes se tivessem que se enquadrar em um outro formato de vida.
Todos somos diferentes entre nós, ainda que participantes de uma mesma espécie da criação. Ninguém é xerox do próximo, física ou psicologicamente. Quando se encontram duas pessoas que afinam dentro de um novo esquema satisfatório para ambos, acredito que encontraram o mapa da mina, e aposto sinceramente que vivem o sentimento amoroso profundo sem o qual a vida deixa de ter sentido. Não há o certo, não há o errado; há o diferente, há o novo, há a fórmula que cada casal encontra para ser feliz. A partir de que não estejam prejudicando nem a si mesmos nem a outrem, e vivam suas escolhas com dignidade, toda maneira de amor vale a pena, toda maneira de amor vale amar.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

PAIXÃO É..., AMOR É..., AMIZADE É...

Gerana Damulakis

A paixão nasce assim, coisa de um instante e, nasceu. É um sentimento arrebatador, que embriaga, que cega. Não é o amor que é cego. Cega é a paixão, estado alucinante, mas, convenhamos, uma delícia. Ainda bem que acaba em tempo, para não enlouquecer o sujeito apaixonado, mas pode se transformar, melhor ainda.
Amor é transformação de algo que existia anteriormente, seja admiração, seja confiança, seja respeito, seja mesmo paixão.
Amizade é o único sentimento que se constrói. Sendo sentimento em permanente construção, são as vivências dos bons e dos maus momentos que conferem o alicerce seguro da amizade, pois que é composição feita tijolo após tijolo. Não há quem obrigue o outro a sentir amizade por quaisquer meios. Sentimento especial, o mais desinteressado e o mais difícil. Uma pedra fora do lugar e fica um edifício feio.
Sem pensar muito, deixando fluir o gosto sem interferência do conhecimento, o romance que retrata a paixão com mais intensidade é Servidão Humana, de Somerset Maugham. O que retrata o amor na sua maior constância ao longo da vida é O amor nos tempos do cólera, de Gabriel García Márquez. E, por fim, a amizade tão bem retratada em Os Três Mosqueteiros, de Alexandre Dumas.

10 ANOS SEM HERBERTO SALES

Gerana Damulakis

Em 13 de agosto de 1999 morreu Herberto Sales. Autor de um clássico da literatura brasileira do século XX, o romance Cascalho, Herberto deixou uma obra aplaudida. Dos contos, tantos são antológicos, no sentido que a palavra grega encerra, inesquecíveis. Dos romances, mais de uma dezena, destacam-se o já citado Cascalho, Einstein, O Minigênio, Os Pareceres do Tempo. Ainda: três volumes de memórias, vários de literatura infantil, um volume de literatura infanto-juvenil e um de viagem.
Conheci Herberto Sales na Academia de Letras da Bahia. Ele contou casos engraçados, inclusive um deles ficou na minha memória: ele estava com pneumonia, muito febril e certo de que não passava daquela noite; acendeu, então, uma vela e, com o restante do quarto na escuridão, ficou mirando a vela com olhos pregados, esperando com certo deleite ela - a morte - chegar, assim que a vela apagasse, mas ela não apareceu. Ruy Espinheira Filho seguramente lembrará deste episódio narrado naquele fim de tarde.
Meu texto preferido, escrito por Herberto, é o conto “O Automóvel”. Em texto para palestra na ALB, que depois passou a integrar o volume da Revista da Academia de Letras da Bahia, nº 44, de novembro de 2000, o acadêmico Aramis Ribeiro Costa atenta para uma curiosidade: Maupassant condenava o recurso do acaso na ficção, dizia que não se deve deixar cair uma telha na cabeça de um personagem central. Escreve Aramis: “Herberto, neste 'O Automóvel', ousando contrariar o mestre francês, deixa caírem duas telhas seguidas na cabeça do personagem”.
Realmente o Herberto contista preza na ficção curta o prazer de contar, acima das receitas já confirmadas ou não. Para encontrar o contista Herberto Sales, e dobrar este prazer, vale ler e adentrar tal universo com Ângela Vilma e seu ensaio A Tessitura Humana da Palavra — Herberto Sales, contista. Este volume, que tem o Selo Editorial Letras da Bahia, foi aprovado por Hélio Pólvora, quando fazíamos parte da comissão editorial da FUNCEB, daí que posso testemunhar como todos nós, responsáveis pelas aprovações da Coleção, ficamos encantados com o desenvolvimento do texto ensaístico. Originalmente foi a dissertação de mestrado de Ângela Vilma, mas em livro o que ela apresenta, com sua linguagem sensível para escrever sobre a arte literária, é um texto que suscita imediatamente a vontade de ler e reler Herberto Sales. Ainda agora, reli os capítulos preferidos por Hélio. Conversamos, Aramis e eu, sobre como Ângela Vilma compara os contos “Teoria do Medalhão”, de Machado de Assis e “Teoria do Executivo”, de Herberto Sales. Garanto, o leitor fica tão envolvido, busca os dois contos, e procura compartilhar este prazer acompanhado do livro da ensaísta.
É isso, Herberto, um dia a vela apaga e ela chega mesmo, precisa nos levar. Para alguns, como você, ela não chega completamente (como queria Bandeira naquele poema em que pede para morrer completamente sem sequer deixar um nome). Está escrito na história da literatura brasileira o nome do baiano, imortal da Academia Brasileira de Letras, Herberto Sales.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

PARABÉNS E ALEGRIA PARA LUÍS ANTONIO CAJAZEIRA RAMOS


Gerana Damulakis

Luís Antonio Cajazeira Ramos faz aniversário. Amigo,depois poeta. Assim o vejo. E não adianta ele desejar que seja diferente, que a poesia seja maior que a amizade. Ele é teimoso, que cara teimoso, mas foi sua teimosia que me tirou de casa no ano passado, quando inventou uma tal reunião mensal com um grupo pequeno, só para trocar ideias sobre literatura e fazer leituras em voz alta. Era junho, levei um tempão para sair de casa porque, desde a morte de meu pai, apenas Aramis conseguia que eu desse umas saídas rápidas, porém não mais Academia de Letras, não mais eventos literários, nada com muitas pessoas. O teimoso do Luís insistiu e insistiu. Era junho, ano passado, levei um tempão escolhendo a roupa, quase uma noiva. No meio do caminho, o celular tocou, era o teimoso perguntando a razão do meu atraso. Estou chegando, calma! Eu, meio eufórica, tinha conseguido sair. Melhorei muito de lá para cá. As reuniões todo mês. Graças a Luís, o teimoso.
Mas não gosto de Luís só por conta do episódio: o episódio é ilustrativo. Conheço-o de outros carnavais, há mais de dez anos. Ele escreveu para mim, no exemplar do livro Mais que sempre: “Gerana, a primeira pessoa a reagir com palavra escrita sobre minha palavra escrita. Isto é muito, é sempre, é mais que sempre”. Fiquei tão contente. Ele é teimoso, já escrevi várias vezes, está em tempo de outros indicativos: ele é justo, ele é amigo verdadeiro, não gasta sentimentos à toa. É, lembrei bem, ele é muito justo: sua característica maior.
Seja de Fiat breu, passando por Como se, depois Temporal temporal e Mais que sempre, de Luís Antonio Cajazeira Ramos poderia escolher vários sonetos, mas hoje é dia 12 de agosto, Luís nasceu porque dadas pessoas, lá atrás no tempo, se amaram. A escolha está feita.

AO AMOR
Luís Antonio Cajazeira Ramos

Meus bisavós maternos namoravam
de mãos dadas até já bem velhinhos.
Quando jovens juraram que se amavam,
e a vida nunca mais os viu sozinhos.

Vovó Iaiá e Pai Lulu gostavam
um do outro, tanto, que ninguém sabia,
depois de tanto tempo, se adoravam,
com tanta devoção, Jesus, Maria.

Ele, falante, um bom gourmet, um porto.
Ela, risonha, um bom crochê, conforto.
Ambos, um poema simples, claro e denso.

Não conheci nenhum dos dois. Que pena.
E mesmo assim a vida vale a pena.
Trago em meu sangue seu amor imenso.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

ESTE ERA O CARA

Gerana Damulakis

Este, sim, era o cara! O conto moderno tem três mestres, Guy de Maupassant, A. P. Tchekhov (grafado como está nas traduções do meu querido amigo Boris Schnaiderman, o realmente grande tradutor) e Katherine Mansfield.

Um levou ao outro que levou ao outro, como uma evolução. O próprio Tchekhov reconheceu que Maupassant levou o conto a tal ponto quanto às exigências que seria impossível escrever à maneira dele, daí partiu para a concisão, para a eliminação de tudo o que não fosse indispensável e, grande ousadia!, para o corte do princípio e do fim de uma história.

Grande exemplo de tudo isso é o conto "Angústia". Um cocheiro perde seu filho. Vendo-se obrigado a trabalhar sem descanso, atendendo a pessoas completamente insensíveis ao seu luto e sem ninguém com quem possa desabafar, pois, inclusive seu colega, se afasta enfadado, o homem desafoga com seu cavalo, enquanto este está remoendo o feno, obviamente sem entender sua dor.

R. Magalhães Júnior aponta para a simplicidade do texto. Texto monótono e, no entanto, repleto de emoção! Escreve, então, em A arte do conto: "Um imenso conteúdo de emoção se encerra nos períodos descosidos, na enumeração cinzenta de mesquinhos episódios, sem maior significação aparente, nesse torturante repisar do tema sombrio".

Creio que cada conto de Tchekhov traz duas histórias. Basta sair em busca, ler uma buscando a outra. É aquela coisa: a história atrás da história, que em "Angústia" resulta na história do egoísmo, da insensibilidade dos homens para com a dor alheia. A solidão é o personagem da história atrás da história. A solidão gera o outro personagem: a tamanha angústia da alma.

Este era o cara. Este é o cara!

domingo, 9 de agosto de 2009

Ó PAI


Gerana Damulakis


Por que me abandonaste?
Cristo


Qualquer dia, qualquer mês
e estou só.
Só as estrias de luz mostram o ar
carregando suas massas de partículas
redondas, tantas quantas são
as pessoas da multidão.
Lá fora é onde deve haver alguém.
Por que tarda?
Estou em plena tarde
sem perder o relógio de vista.
Preciso dizer-te isto, meu Pai,
que já vivo a minha tarde
e tenho medo.



Sei que já fiz uma postagem com o mesmo poema, sei que já fiz uma postagem com a mesma foto. Estou, influenciada por Maria Muadiê, me repetindo. Mas, só tenho um ou dois poemas apresentáveis. Mas, não sei passar direito minhas fotos para meu computador. Então,... é tão horrível não ter mais pai, assim como aquele barquinho que vejo daqui, lá no mar, sozinho, cinza no meio de tanto azul. Encerrando, para não amarelar. GD

sábado, 8 de agosto de 2009

NOME DE MULHER

Gerana Damulakis


Qual a importância do nome da personagem? O nome que o autor escolheu para sua personagem, ainda mais se ele for o título do conto ou do romance, vai causar uma caracterização precipitada?

Lembro da exclamação, já tão repetida, de Flaubert: "Madame Bovary, c'est moi!". Então, um tanto do autor está nas suas personagens e o batismo de uma mulher, personagem ficcional, vem trazendo sinais do criador. Quando não se pensa assim, pensa-se que aquele nome de mulher foi escolhido porque combina com a "heroína" do conto ou romance. Veja se consegue imaginar outro nome para ela: uma russa da sociedade, casada, que se apaixona desesperadamente por um conde canalha e que acaba se atirando debaixo de um trem... seu nome, Anna Kariênina. E Rebecca, a inesquecível? E Lolita, de Nabokov, poderia ter outro nome?
O assunto é fascinante e será motivo de uma antologia de contos. Todos os contos trazem no título - e por isso assim se intitulará a antologia - um NOME DE MULHER.