terça-feira, 9 de outubro de 2007

SARAMAGO, SEMPRE SARAMAGO

O Ano de 1993 é o título da mais recente publicação de José Saramago pela Companhia das Letras. Trata-se de uma ficção curta, um tanto diferente dos demais romances e contos do Nobel de Literatura de 1998. Todavia, é apenas um tanto diverso, não mais que isto. Os parágrafos são curtos — quando sabemos quão longos costumam ser — mas nem trazem ponto no final de cada um, o que é bem ao gosto de Saramago — a transgressão no modo de pontuar. O que se tem é um livro que foi escrito em 1975 e remete o leitor para o ano de 1993, décadas adiante, portanto. Para o futuro a previsão era a catástrofe: cidades destruídas, habitadas por lobos, subjugadas completamente por animais mecanizados. Os humanos perambulam em malta como se passassem pelas épocas da própria história. Assistimos o momento pungente do nascimento de uma criança, quando já não havia mais nascimentos, assistimos o reaprendizado do amor e assistimos, também, a mais uma tentativa para fazer o mundo de outro jeito, haja vista os três últimos parágrafos na escrita sintética da parábola saramaguiana: “Uma vez mais enfim o mundo o mundo algumas coisas feitas contadas tantas não e sabê-lo/ Uma vez mais o impossível ficar ou a simples memória de ter sido/ Consoante se conclui de nada haver debaixo da sombra que a criança levanta como uma pele esfolada”. Não são versos, mas não há como resistir, e colocá-los como se assim fossem, parece muito natural.
Este é um ritual de passagem, a poesia se despedindo e a prosa querendo ser simplesmente: este é um livro que ainda se quer poesia, e que se quer prosa, e que já é um prenúncio do que estava por chegar então. Inclusive muito da temática futura se acha presente. De mais imediato a memória detecta o Ensaio sobre a cegueira e o Ensaio sobre a lucidez, mas está ali o germe de A jangada de pedra e até de História do cerco de Lisboa, quanto à exclusão social de uns e o favorecimento de outros, ou, em outras palavras que resultam no mesmo, quanto à dominação de poucos sobre muitos.
De resto, é Saramago, sempre Saramago e mais um texto para os aficcionados que, seguramente, encontram além do prazer da leitura, motivo para admiração pelo escritor português.
Gerana Damulakis

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

NÃO HÁ MAIOR OBRA-PRIMA

O site www.jornaldedebates.com.br está levantando a seguinte questão: qual a maior obra-prima da literatura brasileira? Postadas as considerações abaixo, por entretenimento, vale passear pelas obras que vão ocorrendo após a pergunta do mundo virtual. Primeiramente é bom avaliar a pergunta. A expressão "maior obra-prima" traz algo que incomoda: talvez seja a redundância encerrada no termo. A obra que já é prima, já é uma obra maior. As obras de uma determinada literatura se encaixam em degraus variados. No patamar estão as que alcançaram um nível de qualidade que as equipara. Em tal patamar, na nossa literatura, convivem, sem favor, desde O Guarani, de José de Alencar, Memórias Póstumas de Brás Cubas, do grande bruxo Machado, até Mar Morto, de Jorge Amado e Grande Sertão: Veredas, de Rosa.
Para restringir o número de obras, vale determinar um período: últimas décadas do século XIX e todo o século XX. E mais um limite interessante: ficar com obras escritas por autores já falecidos. Temos a obra-prima O Cortiço, de Aluísio Azevedo; Recordações do Escrivão Isaías Caminha, de Lima Barreto, e a igualmente maior Vida e Morte de M. J. Gonzaga de Sá, do mesmo Lima, um escritor voltado para o romance social com estilo singular; listo, ainda, José Lins do Rego, tanto com Fogo Morto, quanto com Pedra Bonita; os romances como Terras do Sem-Fim, ou os exóticos e sensuais como Dona Flor e Seus Dois Maridos, do nosso Jorge Amado são inesquecíveis, portanto maiores; e o Érico Veríssimo do monumental O Tempo e o Vento; o intimismo revolucionário de Clarice Lispector, que fez uma horda de seguidoras; sem esquecer Rachel de Queiroz de O Quinze e o Graciliano Ramos com a economia verbal, outro mestre, de Angústia e São Bernardo; o grande Guimarães Rosa e a grande linguagem; enfim, são muitos os autores e são muitas as obras que se destacam em excelência. Tantas, lado a lado. E isto abordando apenas a ficção, mais precisamente o romance, porque se adentrarmos o universo da poesia, o patamar defendido terá uma lotação considerável. Como o intuito é apenas o da diversão, pode-se puxar uma obra dentre aquelas: Memórias Póstumas de Brás Cubas. Mas enfatizando que não existe a maior, existem as maiores obras.

Gerana Damulakis

O OGRO QUIROMANÍACO



Tudo começou quando percebi que minha aparência de ogro urbano estava sendo levemente observada por dois olhos vivos, ávidos e fugidios como os de uma criança. Alê surgiu envolta numa beleza branca, tímida e brilhante. Não sei quanto tempo ela me olhou, contudo posso afirmar que foi uma olhadela bem suave como ela própria. Aos poucos pude notar que Alê era dona de um semblante singular, incomum e pouco prosaica. Ao que me parece não são todos os olhos que desnudam a pele branca e límpida de Alê. Não sei como surgiu essa curiosidade de espiá-la, talvez em retribuição à observação primária feita por ela a mim. Entretanto e provavelmente ela mesma não se dava conta de que observava sem querer. Talvez curiosa pelo meu aspecto monstruoso. O fato é que não conseguia desviar o olhar daquela criatura do universo. Natural, encantadora e quiçá enigmática como o próprio cosmos. Nossos olhos passaram então a encontrarem-se uns aos outros numa rapidez e timidez contumaz. Um afinco só atestado por nós dois. Sabíamos que não iríamos além de só fazer nos perceber. Vontade não me faltou, pelo menos a mim, de sentar e conversar, lógico sem procurar assustá-la, pois apesar de fantasiar e dominar as palavras muito bem, meu aspecto, como já falei, era talvez carunchoso. Jamais procuro arrefecer meu semblante bestial. Queria, no entanto iniciar uma conversa de horas, dias. Semanas até. Por vezes e naturalmente, quando meus olhos pousavam sobre ela, sem que me visse, registrava seu corpo em minha memória itinerante e desejava-a numa volúpia voluntariosa. Em meu pensamento o sexo de Alê eram dois lábios grossos e fibrosos, tinha os pêlos pretos e bem aparados. Além de uma ou outra sarda ao redor. O botão do clitóris em cima, rijo e inchado pedia minha língua áspera. O visco, o fio de baba ligava-se à minha boca e eu ouvia o sussurro rumorejante do gozo de amor de Alê.
Numa manhã servi-lhe café. Esperei propositalmente o momento em que Alê se aproximou da mesa posta e lhe ofereci a minha gentileza. Ela sorriu e perguntei-lhe o nome. Sorrindo mais ainda, com os dentes brancos a mostra, Alê respondeu e quis saber o meu. Acho que exalei uma espécie de elixir de Dom Juan, ou o espírito, alma, qualquer coisa que valha nesse sentido, de Dorian Gray que me tomou como cavalo. Derramando de vontade e desejo, penetrei em toda profundidade dos olhos de Alê. Pude então notar como realmente são vivos, sôfregos, ansiosos por palavras e pensamentos. Pus então na minha cabeça que só eu com minha verve de escritor poderia municiá-los. Desde então passei a procurá-los sempre. Veio em minha memória recordações de Beatriz de Dante. Ou da senhora de Rênal de Stendhal. Ou até mesmo Charlotte que deixou o jovem Werther louco de paixão letal e suicida. Quanto a Dante, não sei se é preciso passar pelo inferno e purgatório para depois encontrar Alê no paraíso. Até porque acho que já estou purgando há tempos. Minha aparência de bicho-papão e minha mulher, Cuca zangada, me colocavam na barca do auto-do-inferno.
Numa noite, entretanto pude ver um aspecto diferente no rosto de Alê. Estava séria e preocupada conversando com algumas pessoas. Fiquei inquieto e apreensivo e com atenção redobrada nos olhos tentei ler os seus lábios. Não entendi de todo, mas provavelmente Alê falava de alguma cirurgia, equipe médica ou coisa do gênero. Fiquei sabendo através de perguntas distraídas que Alê era médica. Encetei uma conversa despretensiosa com a mãe dela, na sua iminente ausência e colhi algo sobre ela. Mesmo assim Alê continuou enigmática para mim. Não tive sensação de déjà vu, ainda bem, posto que as pessoas são sempre parecidas e certas vezes, são iguais. Sobretudo as mulheres. Com Alê não tive essa impressão de início, nem de meio. Espero que no final eu não me decepcione. Em poucos dias senti toda essa gama de sentimento por uma pessoa até então desconhecida.
No dia seguinte, da janela do hotel que me encontrava, pude ver Alê tocando violão. Tive a impressão que olhava para meu quarto, para a mesma janela em que eu a espionava. O vidro era fumê, portanto eu a via, ela por sua vez não fazia idéia que havia alguém por trás do vidro a espreitá-la. Contudo através daquele vidro escuro percebi a alma de Alê. Lá longe, ela com sua brancura do infinito possuía um feitiço da lua. E como por osmose, notei que Alê me queria. Queria sugar todo o meu eu intelectual e interativo. Por isso sorria para mim. Por isso trocava olhares furtivos. Por isso conversava distraidamente com minha mulher zangada, enquanto eu torcia para que fizessem amizade para eu ficar mais tempo perto daquela suntuosa magnitude do universo. Por isso deixava as coxas e o baixo ventre bem ao alcance de meus olhos. Eu ficava viril e latente quando via de relance o talho. Ao mesmo tempo, quando a olhava perdido em meus pensamentos, sonhando no vai-e-vem das minhas mãos, dos meus punhos de ferro, percebia o tempo passar vagarosamente entre eu e Alê. Aos poucos aquela nuvem branca que eu via e desejava a ponto de masturbar-me e gozar sufocantemente, num soluço renitente, distanciava-se de mim num êxtase delirante de pensamento e seu clímax vertido com ímpeto. Agora eu via a minha mulher, a Cuca zangada, sentada na mesa da beira da piscina sozinha e inerte na cadeira de rodas junto com a criada.
Alê, por sua vez, explodiu no universo, transformando-se em nuvem de pensamento de Onã.

Carlos Vilarinho
cronista e contista, autor de As Sete Faces de Severina Caolha & Outras Histórias (FUNCEB, 2005), Coleção Selo Editorial Letras da Bahia, 103)

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

NA PRAIA, um romance de Ian McEwan

A literatura inglesa contemporânea passa por um excelente momento e, com algum atraso, podemos acompanhá-la em ótimas traduções. Por exemplo: um dos mais importantes prêmios literários do mundo é o Booker Prize. Pois bem, estão nas livrarias os concorrentes e os vencedores deste prêmio nos últimos anos. No mais alto patamar de qualidade encontramos Arthur & George, de Julian Barnes, Não me Abandone Jamais, de Kazuo Ishiguro, e o vencedor O Mar, de John Banville. Um deleite para quem sente verdadeiro prazer na leitura e gosta de comparar e eleger. Os três livros são excelentes, mas O Mar tem uma força quase trágica que, seguramente, garantiu o prêmio. Por outro lado, o final do livro de Ishiguro é impactante. E assim vamos, como aficionados pela arte literária, lendo e debatendo os valores, encantando a alma.
Nesta última leva de lançamentos há outro escritor, igualmente premiado com o Booker, e muito festejado mundo afora. Trata-se de Ian McEwan. O romance, que na nossa concepção mais rígida em termos de gênero, seria considerado uma novela, ou, como dizia Jorge Amado, um “romancinho”, intitula-se Na Praia e está na lista dos mais vendidos de todas as revistas que fazem este tipo de pesquisa. Todavia não se define como um best- seller. Está na lista, tal como está Travessuras da Menina Má, de Mario Vargas Llosa, ou seja, ambos são exceções porque nada têm da famosa mistura de crime, sexo e um monte de informações que se querem eruditas para impressionar.
Na Praia é uma trama passada nos anos 60, quando a revolução sexual estava perto de irromper, mas ainda guardava seu poder de explosão. A noite é a das núpcias de um casal virgem. O desastre emocional, que resulta na definição da vida futura deste par inexperiente, traduz os costumes de uma época e chega além, pois que atinge o social em variados aspectos dentro de um tempo firmemente datado.
Certa crítica, exigente por conta de outros títulos mais fortes de Ian McEwan, tais como Reparação e Sábado, chega a apontar deficiências, como o pouco aprofundamento do autor ao descrever o íntimo da noiva; entretanto, será que não cabe ao leitor, não apenas o gosto, mas também o direito, de imaginar, de ser um co-autor e completar a obra? Houve quem escrevesse que perto da obra sinfônica de McEwan, Na Praia soa como uma peça de câmara, porém ressaltou que, ainda assim, a execução é irretocável. E o que unânime é a entronização de Ian McEwan como o melhor ficcionista vivo da melhor das literaturas nacionais. Assino embaixo.
GD

OS ANJOS CAIADOS DE ARIOVALDO MATOS

Com data, na ficha catalográfica, registrada em 2005, mas impresso em 2006, o romance Anjos Caiados, de Ariovaldo Matos, foi publicado mediante convênio entre a Assembléia Legislativa do Estado da Bahia e a Academia de Letras da Bahia. A edição, muito bem cuidada, vem trazendo textos importantes, além da cronologia da vida do escritor, seja o jornalista, seja o ficcionista. Encontramos testemunhos tal como o de Othon Jambeiro, assinando “Ari, um jornalista”, enquanto Jorge Amado assina “Um ficcionista baiano”. Já o saudoso Guido Guerra, que foi responsável pela reunião dos contos de Ariovaldo Matos, organizando e selecionando os textos do volume intitulado A Ostra Azul, publicado em 1998, comparece com “Trajetória”. Ariovaldo dedica o romance à memória, entre outros nomes que lhe foram caros, do jornalista Flávio Costa. E agradece a paciência dos que “suportaram suas fantasias de repórter”, entre os quais, primeiramente está Joaci Góes.
Mas, vamos ao romance. São três partes, construídas com uma dose de experimentalismo digna do Cortázar de Rayuela (O Jogo da Amarelinha), como bem notou Guido Guerra, por conta da estrutura multifacetada que recorre ao diálogo teatral, que usa cartas e poemas, que insere, enfim, narrativas várias. O romance teve origem no conto “A construção do sonho” e, por isso, Guido deixou justamente este conto fora da antologia A Ostra Azul, respeitando seu desdobramento, ou o fato do conto ter atingido outro gênero, que lhe seria mais próprio. Muito rico, portanto, é Anjos Caiados. Porém, muitos gostariam de conhecer o conto citado por Guido, daí que seria interessante que Fred Matos, filho de Ariovaldo, também contista e já com livro publicado, em 2006, pelo selo Letras da Bahia, da Fundação Cultural do Estado/ Secretaria da Cultura e Turismo, intitulado Melhor que a encomenda, trouxesse o texto para o público de hoje.
A linguagem é prioridade em se tratando de Ariovaldo, ela é senhora e dona do começo ao fim de qualquer narrativa escrita por ele, porque não se faz a leitura sem sentir admiração, sem deslumbrar-se com o seu fluir livre de obstáculos, ainda que num romance elaborado com tanta complexidade, que lança mão de tantos recursos e de muitos personagens. O tema vem revestido da mistura de religiosidade e sensualidade, da cultura judaico-cristã e dos pecados da carne. A personagem Liúba é bela e sensual. O Padre Eugênio é padre e é homem, e o resultado é a transgressão.
Jornalista, dramaturgo, contista, romancista, muito premiado, traduzido inclusive, Ariovaldo Matos fixou seu nome na literatura baiana. Em 2008 sua morte fará 20 anos. Há contos que ficaram de fora quando Guido fez a seleção. É tempo para organizar outra reunião com tal material.
Gerana Damulakis

POETRIX, de Goulart Gomes

EQUILIBRAÇÃO

aprender uma nova lição:
o ponto de equilíbrio
é o ponto de mutação




TRADE MARX

o lucro não é o fim;
a mais-valia que anseio
é o que vale mais em mim

50 ANOS ON THE ROAD



No dia 5 de setembro de 1957 foi publicado o livro On the Road, de Jack Kerouac. Por conta do aniversário de 50 anos, a editora Viking lançou, pela primeira vez em formato de livro, a versão original que o autor datilografou em um rolo de papel para telex de 36 metros de comprimento. O manuscrito difere da versão final por não ter parágrafos, por ser maior em 120 páginas, por trazer os nomes verdadeiros dos personagens, por conter descrições sexuais sem censuras, afinal, é fruto de uma escrita enlouquecida que levou três semanas para ser concluída, contando uma aventura que se prolongou por sete anos. Após três revisões, o que era memória virou ficção, ganhou adornos literários e Neal Cassady, amigo de Kerouac, passou a ser chamado de Dean Moriarty, enquanto surgiu Sal Paradise, personagem com base no autor, formando um par que atravessa os EUA bebendo, ouvindo música e se envolvendo com todos que cruzam seu caminho.
Da “batida” do jazz associada ao misticismo oriental nasceu o termo “Beat”, em 1952, cunhado por Kerouac para o “movimento que daria voz ao espírito de uma geração em revolta contra o conformismo e a respeitabilidade dos EUA da Multidão Solitária”, segundo Malcolm Bradbury, em O romance americano moderno (Jorge Zahar Editor, 1991). Por outro lado, é certo que a palavra beat tem uma gama de outros sentidos: vai da “batida”, até “botar o pé na estrada” (beat the way), passando por “trilha”, “furo” (jornalístico), mas Kerouac ouviu da boca de um marginal com o sentido de “exaltada exaustão”.
Ainda que William Burroughs tenha sido mais importante como experimentador e, ainda que a expressão poética deste clima emocional tenha ficado por conta do longo poema “Howl” (“Uivo”), de Allen Ginsberg, é o romance de Kerouac, aqui traduzido como Pé na estrada, editado pela L&PM, com tradução, prefácio e delicioso posfácio de Eduardo Bueno, que marca a “prosa bop espontânea”, que influenciou uma horda de escritores nos anos 60.
Não parece necessário que haja uma idade certa, tanto para ler Pé na estrada, quanto para ler O apanhador no campo de centeio, de J. D. Salinger, parece mais possível que haja o leitor certo para estas narrativas que vivenciam tão profundamente a juventude, sendo até melhor fazer a leitura quando já se está olhando, na segurança da praia, como as ondas são revoltas. A revolução comportamental gerada por On the Road inclui gente como Bob Dylan, que fugiu de casa depois de ler o livro. Basta que o leitor seja capaz de lembrar a inquietação, o fascínio pelas descobertas e o sonho de liberdade, para que usufrua totalmente tais caminhadas. A dupla de Kerouac cruzando o país inteiro a partir da Rota 66, desbrava, transgredindo, outra estrada: a que se vai construindo ao abandonar a infância. A “bíblia hippie”, o mito On the Road, para usar o chavão proporcionado pelo livro-prisão, ofuscou suas outras obras, como The Dharma Bums (Os vagabundos iluminados). Jack Kerouac morreu em 1969: estava apático, sem nenhum espírito de aventura.
Gerana Damulakis