A revista mexicana, Plural, fundada por Octavio Paz, trouxe, em 1989, um poema intitulado “Instantes”, o qual teria sido escrito por Jorge Luis Borges no ano de sua morte. Segundo Alberto Manguel - ensaísta brilhante, nascido em Buenos Aires, mas atualmente cidadão canadense -, no capítulo “Falsificações”, de seu livro À mesa com o Chapeleiro Maluco – Ensaios sobre corvos e escrivaninhas (Companhia das Letras, 2009), o poema estava precedido por um “meloso comentário” de Mauricio Ciechanower, o qual apontava na obra um poder de síntese magistral. Pois bem, para Manguel, o poema é uma meditação idiota e sentimentaloide.
Três anos depois, ainda segundo o ensaísta supracitado, foi publicada uma nova tradução dos versos, no Queen’s Quarterly: “Moments”, traduzido por Alastair Reed, já experimentado na arte de traduzir o grande escritor argentino.
Em 1999, o crítico Francisco Peregil (sigo com Manguel) revelou ao jornal El País, de Madrid: “O verdadeiro autor do apócrifo é uma desconhecida poeta norte-americana chamada Nadine Stair, que o publicou em 1978, oito anos antes da morte de Borges em Genebra, aos 86 anos”.
O texto continuou a aparecer e ganhou o mundo. Prosa poética melosa? Talvez, assim se parece em certos instantes. Mas o primeiro verso é... um sonho.
INSTANTES
----------Nadine Stair
Se eu pudesse viver novamente a minha vida,
na próxima trataria de cometer mais erros.
Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais.
Seria mais tolo ainda do que tenho sido; na verdade,
bem poucas pessoas levariam a sério.
Seria menos higiênico.
Correria mais riscos, viajaria mais, contemplaria
mais entardeceres, subiria mais montanhas, nadaria mais rios.
Iria a mais lugares onde nunca fui, tomaria
mais sorvete e menos lentilha, teria mais problemas
reais e menos imaginários.
Eu fui uma dessas pessoas que viveram sensata e produtivamente
cada minuto da sua vida; claro que tive momentos de alegria.
Mas, se pudesse voltar atrás, trataria de ter
somente bons momentos.
Porque, se não sabem, disso é feito a vida: só de momentos;
não perca o agora.
Eu era um desses que nunca ia a parte alguma sem um termômetro,
uma bolsa de água quente, um guarda-chuva e um paraquedas.
Se voltasse a viver, viajaria mais leve.
Se eu pudesse voltar a viver, começaria a andar descalço no começo
da primavera a continuaria assim até o fim do outono.
Daria mais voltas na minha rua, contemplaria mais amanheceres
e brincaria com mais crianças, se tivesse outra vez uma vida pela frente.
Mas, já viram, tenho 85 anos e sei que estou morrendo.
Ilustração: I'd pick more daisies...(after Nadine Stair), 2006. Oil and Acrylic on Canvas 90cm x 120cm. Caroline Evans Paintings.www.carolineevanspaintings.com/.../1219347.jpg
Três anos depois, ainda segundo o ensaísta supracitado, foi publicada uma nova tradução dos versos, no Queen’s Quarterly: “Moments”, traduzido por Alastair Reed, já experimentado na arte de traduzir o grande escritor argentino.
Em 1999, o crítico Francisco Peregil (sigo com Manguel) revelou ao jornal El País, de Madrid: “O verdadeiro autor do apócrifo é uma desconhecida poeta norte-americana chamada Nadine Stair, que o publicou em 1978, oito anos antes da morte de Borges em Genebra, aos 86 anos”.
O texto continuou a aparecer e ganhou o mundo. Prosa poética melosa? Talvez, assim se parece em certos instantes. Mas o primeiro verso é... um sonho.
INSTANTES
----------Nadine Stair
Se eu pudesse viver novamente a minha vida,
na próxima trataria de cometer mais erros.
Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais.
Seria mais tolo ainda do que tenho sido; na verdade,
bem poucas pessoas levariam a sério.
Seria menos higiênico.
Correria mais riscos, viajaria mais, contemplaria
mais entardeceres, subiria mais montanhas, nadaria mais rios.
Iria a mais lugares onde nunca fui, tomaria
mais sorvete e menos lentilha, teria mais problemas
reais e menos imaginários.
Eu fui uma dessas pessoas que viveram sensata e produtivamente
cada minuto da sua vida; claro que tive momentos de alegria.
Mas, se pudesse voltar atrás, trataria de ter
somente bons momentos.
Porque, se não sabem, disso é feito a vida: só de momentos;
não perca o agora.
Eu era um desses que nunca ia a parte alguma sem um termômetro,
uma bolsa de água quente, um guarda-chuva e um paraquedas.
Se voltasse a viver, viajaria mais leve.
Se eu pudesse voltar a viver, começaria a andar descalço no começo
da primavera a continuaria assim até o fim do outono.
Daria mais voltas na minha rua, contemplaria mais amanheceres
e brincaria com mais crianças, se tivesse outra vez uma vida pela frente.
Mas, já viram, tenho 85 anos e sei que estou morrendo.
Ilustração: I'd pick more daisies...(after Nadine Stair), 2006. Oil and Acrylic on Canvas 90cm x 120cm. Caroline Evans Paintings.www.carolineevanspaintings.com/.../1219347.jpg
11 comentários:
O poema ganhou o status de Borges ou seja foi lido como uma obra sua, o que provoca diferenças. Quem teve a idéia inicial de imputar o poema a Borges foi um gênio, e nos faz refletir sobre a recepção de uma obra de arte. Instantes é realmente instigante. Abraço.
Gerana, hay tanto para decir sobre ese poema...Al margen de que, en efecto, NO es de Borges, se han ido encadenando cosas que al mismo Borges hubieran divertido.
Borges habla, en Pierre Menard, de una etapa de la literatura en que habrá "anacronismos deliberados y atribuciones erróneas". Y esto fue lo que pasó con este poema, escrito por una anciana en un geriátrico de Estados Unidos, y publicado, perversamente, con la firma de Borges en una revista new age de Buenos Aires.
A partir de allí, el poema tuvo una repercusión increíble, pero como obviamente era inhallable en ningún libro de Borges se difundió en afiches, tarjetas, señaladores, etc; o sea, en el circuito ideal para aquellos que NO leían libros de Borges ni estaban familiarizados con su estilo.
Tempranamente aparecieron desmentidas sobre el hecho; pero la gente que consume tarjetas y señaladores, no son lectores asiduos de Plural ni del diario La Nación.Hasta hay un eco de ese poema en el tema Epitafio en un disco de Titãs-(que, si no me equivoco, en la primera edición se atribuía a Borges)
Lo que esta confusión revela es que este es el poema que a la gente que NO leía a Borges les gusta. ¿Por qué? Seguramente porque les parecía que Borges, que les parecía lejano e inaccesible, era- a partir de ese poema apócrifo- un hombre común, un viejito amable.
El hecho, también, revela que Borges para la inmensa mayoría, era objeto de admiración nacionalista-ganar el Nobel como si fuera un mundial de fútbol- pero no era leído.
Borges, ya enfermo de cáncer, tomaba en Ginebra clases de árabe,supervisaba la edición francesa de sus obras por la editorial Gallimard,bosquejaba un guión sobre Venecia y se casaba con María Kodama: ¿hay en todo eso alguna remota señal de resignación?
(Perdón por no escribir en portugués!))
Gerana,não estou conseguindo encontrar o seu email para enviar a permissão de postagem do novo blog.
Escreve para bipedefalante@gmail.com
ou minimoajuste@gmail.com
Beijo
Bípede
Este mesmo, ou algo muito parecido já rolou na NET como se fôra de Gabriel Garcia Marquez.
Gerana, releo tu post y compruebo que leí con rapidez y prejuicio:en la revista Plural también cultivaron, por lo visto, la atribución errónea.
Obrigado por tus visitas em Lisarda!
Talvez seja o caso mais antigo conhecido de obra apócrifa, tão comum na internet hoje em dia.
Na verdade, não sei qual o motivo de tentarem fazer com que um determinado texto ou poema seja atribuído a um determinado autor, da mesma forma como não vejo graça em Hoax, SPAM e outros lixos contemporâneos.
Pelo menos o nome de Borges passa a ser conhecido por um público que não teria esta oportunidade, como bem destacou a Lisarda no comentário acima.
Instantes...
Maravilhoso, despertante e reflexivo! ;)
Sempre fui absolutamente fascinada pela história deste poema. Adorei você ter voltado a ela, Gerana. Creio que Lisarda, aí acima, disse muito, e bem.
GERANA:
Conheço gente que diz ser Borges
seu autor de cabeceira e dele co-
nhece apenas esse texto, e não o
autêntico "Instantes", que se en- contra no livro "O outro, o mesmo",
de 1964.
SIDNEY WANDERLEY
Já li em alguns lugares versões semelhantes a este poema, sempre apócrifos. Há alguns poemas com os quais acontece isso. Rodam por aí, com o mesmo sentido, mas com expressões diferentes. Será que é mesmo de Borges? Li certa vez uma entrevista de Veríssimo, o filho de Érico (esqueci nome)em que ele fala disso, o número de textos que lhe são atribuidos irresponsavelmente.
Meloso? Eu diria verdadeiro, prosa poética sem grandes refinamentos, mas sentida, uma manifestação da alma. Grande abraço.
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