segunda-feira, 2 de agosto de 2010

O CANTOR DE TANGO



Gerana Damulakis

Quando um livro transforma seu leitor em certo personagem invisível que deu a mão ao escritor e com ele anda pelas ruas de uma cidade jamais antes conhecida; quando o leitor, agora personagem, fecha as páginas do volume e sente, ainda assim, que está vivendo naquela história; então, o romance aconteceu, a arte tomou a vida real e tudo mereceu ser lido. Eu, leitora, sinto desse modo. E o escritor Tomás Eloy Martínez (1934-2010) coloca minha mão na dele, enquanto leio seus romances.


Já fiz, aqui no blog, uma pequena resenha do romance A mão do amo (Companhia das Letras, 2008), que, na época da leitura, me levou a viver com Carmona, personagem central, entre gatos e temente ao poder de uma mãe castradora. Depois, em Purgatório (Companhia das Letras, 2009), de mãos dadas com Emilia, fugimos de Buenos Aires para procurar o amado no Rio de Janeiro, em Caracas e, por fim, fomos viver em Nova Jersey.


Neste O cantor de tango (Companhia das Letras, 2004), percorremos Buenos Aires em andanças noites adentro, conhecemos ruas e cafés; daí, anotei os nomes dos cafés e das calles e fiquei com uma vontade imensa de seguir para a Argentina.


Tomás Eloy Martínez tece seus romances com extrema maestria. O cantor de tango nos remete para a Argentina convulsionada do começo do século 21, em busca de um cantor de tango fenomenal, melhor do que Gardel, mas que nunca gravou seus tangos. Misterioso, ao buscar o cantor, buscamos a história recente, buscamos o Aleph, sentimos o pulsar da cidade e o pulsar de suas marcas, a literatura pungente, o tango fascinante.


Pensei que quando acabasse “Volver” iríamos embora, mas o Martel levou as mãos ao peito, de um modo quase teatral, inesperado vindo dele, e repetiu o primeiro verso de “Margarita Gauthier” pelo menos quatro vezes, sempre com o mesmo registro de voz. À medida que a repetição avançava, as palavras se enchiam de sentido, como se ao passar fossem recolhendo as vozes que as pronunciaram em outros tempos.
Tomás Eloy Martínez, em O cantor de tango

Ilustração: "Tango", da espetacular artista plástica argentina, Virginia Palomeque.

19 comentários:

Mônica disse...

Voce comentando me dá vontade de procurar nas livrarias aqui por perto.
Eu não conheço o autor, mas deve ser excelente.
Obrigada por me visitar. Eu faço de minhas histórias rascunhos.
com carinho MOnica

Unknown disse...

Tem livros que nos fazem percorrer cidades inteiras, são verdadeiros mapas sentimentais, sim, pois os lugares estão ali cheios de significação,

abraço

Jefferson Bessa disse...

"a arte tomou vida real e tudo mereceu ser lido". A experiência da arte é o que afirma na frase, Gerana! A arte então se move e nos vale plenamente.
Beijos.
Jefferson.

Anônimo disse...

Fiquei interessadíssimo no livro. Faz algum tempo que nenhum escritor "coloca minha mão na dele".
Essa sua paixão contagia, Gerana.

glaucia lemos disse...

Que lindo. Ainda não conhecia essa artista. Não preciso dizer que o texto é primoroso e vai muito bem com a ilustração que tem tudo para atrair o leitor.

Sueli Maia (Mai) disse...

Uma outra coisa que me leva admirá-la é o esmero com que partilhas conosco as tuas descobertas.
Por tanto eu te agradeço sempre.


carinho,

Tania regina Contreiras disse...

Gerana, você descreveu com perfeição: quando uma leitura "acontece" é assim mesmo que me sinto. Sempre bem-vindos seus comentários, resenhas, dicas.
Beijo,
Tânia

silvia zappia disse...

Excelente tu crítica, Gerana!
Así es "El cantor de Tango"; así es Tomás Eloy Martínez.
Y genial Palomeque.

(debo decirte que lo que más aprecio de todas tus críticas es el cariño, la ternura que ponés en ellas.Ah!y nos encontramos en algún café, si querés...)

mil besos*

Marcus Gusmão disse...

Também me seduziu. Deu vontade de ler.

Lisarda disse...

Acertas plenamente:se T.E.Martínez tém uma virtude sobresaliente é issa de conducir ao leitor pelo seu mundo.

Buenos Aires é outro livro que amerita ser lido por vc.

Confesso que por um preconceito-contra as modas, não contra T.E.M.-nunca me interesou ler ese livro. Mas, como diz Chorik, a paixão da leitora crítica é contagiosa; acho que afastarei o preconceito.

Flamarion Silva disse...

De Tomás Eloy Martínez só li A sinfonia do mal, que é a introdução do livro de Rubem Fonseca, mais nada. Mas agora estou ficando interessado.
Beijo, GD.

Bípede Falante disse...

Como disse a Mônica, do primeiro comentário, quando você comenta algo, G, dá uma vontade da gente ter e ler :)

aeronauta disse...

Adorei essa expressão afetiva "colocar minha mão na dele". É mesmo assim que acontece.
Suas resenhas sempre nos aproximam dos livros resenhados. Como não ir buscá-los?

Anônimo disse...

Oi minha Gerana querida. Não li nada, vim só te deixar um beijo, como vc deixou pra mim, e que estava tão gostoso. Senti tua falta estes dias de retiro compulsivo, meu, não teu.

Mas tô aqui, pertinho de vc....

Georgio Rios disse...

Tenho me tornado um visitante de carteirnha destas dicas.Um abraço e manda mais e mais.

Jairo Cerqueira disse...

Bom te ler, Gerana.
Mastigadinho, heim? rsrss
Sintetizar uma obra é algo comum à vários escritores. Instigar pela síntese é privilégio de pouquíssimos.
Um abraço.

Eleonora Marino Duarte disse...

gerana, querida,

o livro, visto assim pelos teus olhos, me pareceu imperdível.


belo texto!


um beijo.

Unknown disse...

Quando a narração da história de uma livro emociona, nos faz sair para o comprar, ou obter em algum lugar. E imediatamente começaremos a leitura, com receio de perder o enlevo inicial que fez que percorressemos as mesmas ruas, procurássemos o mesmo cantor, e achássemos o Gardel imaginário que cantava algo do novo Piazzolla. Obrigado. Muito obrigado. Beijos e felicidades.

Lidi disse...

Sou mais uma que adora as tuas dicas. Estou sempre por aqui, embora não comente sempre. Beijo, Gerana.