quarta-feira, 10 de setembro de 2008

O AMOR É UMA COISA FEIA



Gerana Damulakis

Na nossa mais recente reunião, na casa da escritora Gláucia Lemos, o contista Lima Trindade, autor de, por exemplo, Todo Sol mais o Espírito Santo (Ateliê Editorial, 2005), me deu um livro intitulado O amor é uma coisa feia (7Letras, 2007), pela Coleção Rocinante, de Gustavo Rios. Comecei a leitura sem expectativas porque não conheço o autor e também porque jamais li qualquer texto assinado por ele. O que é ótimo para uma avaliação totalmente honesta, destituída de parcialidades, principalmente as emocionais e afetivas. Abri o livro ao acaso, como me ensinou, há uns 10 anos ou mais, a poeta Myriam Fraga; lição que nunca esqueci. Li um conto já da segunda metade do livro e gostei. Li outro, abrindo ao acaso novamente, e gostei; daí já não abri mais o livro ao acaso, pois que li o conto seguinte até terminar o volume. Terminado, abri no primeiro conto e fui lendo rumo ao conto que determinaria que a leitura estava completa.
O conto de Gustavo Rios é curto, muito curto. Afora um ou outro, como "Cinco Palavras", a maioria se dá em duas páginas. Tudo que acontece, ali acontece sem adornos. O ponto é atingido diretamente. Alguns podem pensar, será o tipo de conto que não passa de uma mera anedota? Não. Mesmo quando o conto é, por exemplo, "Mon amour", uma história em 17 linhas,, o autor cuida para deixar aquele toque, nem que seja na última frase, que modifica tudo, que faz a diferença e a literatura. É ficção, pois, e de qualidade: irônica, vasculhando as impossibilidades do sentimento, a incomunicabilidade, o desencontro, a solidão, enfim. Da situação com aparência banal, surge a crise; da crise, tem origem o sentimento em estado mais latente; a partir da visão deste sentimento instala-se a verdade: o conto "Gota d'água" é emblemático do que acabo de afirmar. Parágrafos curtos em contos curtos, linguagem direta, diálogos objetivos, situações expostas prontamente e um mergulho forte, uma pancada. Aí está a panacada: no tom dado pelo insólito que faz parte da dinâmica da vida ou no tom dado pela mesmice na qual a vida está instalada. Finda a leitura, resta dizer: é isso mesmo, este é um livro de contos, o autor conseguiu.