quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

EM CERTOS INSTANTES

GD

A revista mexicana, Plural, fundada por Octavio Paz, trouxe, em 1989, um poema intitulado “Instantes”, o qual teria sido escrito por Jorge Luis Borges no ano de sua morte. Segundo Alberto Manguel - ensaísta brilhante, nascido em Buenos Aires, mas atualmente cidadão canadense -, no capítulo “Falsificações”, de seu livro À mesa com o Chapeleiro Maluco – Ensaios sobre corvos e escrivaninhas (Companhia das Letras, 2009), o poema estava precedido por um “meloso comentário” de Mauricio Ciechanower, o qual apontava na obra um poder de síntese magistral. Pois bem, para Manguel, o poema é uma meditação idiota e sentimentaloide.
Três anos depois, ainda segundo o ensaísta supracitado, foi publicada uma nova tradução dos versos, no Queen’s Quarterly: “Moments”, traduzido por Alastair Reed, já experimentado na arte de traduzir o grande escritor argentino.
Em 1999, o crítico Francisco Peregil (sigo com Manguel) revelou ao jornal El País, de Madrid: “O verdadeiro autor do apócrifo é uma desconhecida poeta norte-americana chamada Nadine Stair, que o publicou em 1978, oito anos antes da morte de Borges em Genebra, aos 86 anos”.
O texto continuou a aparecer e ganhou o mundo. Prosa poética melosa? Talvez, assim se parece em certos instantes. Mas o primeiro verso é... um sonho.


INSTANTES
----------Nadine Stair


Se eu pudesse viver novamente a minha vida,
na próxima trataria de cometer mais erros.
Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais.
Seria mais tolo ainda do que tenho sido; na verdade,
bem poucas pessoas levariam a sério.
Seria menos higiênico.
Correria mais riscos, viajaria mais, contemplaria
mais entardeceres, subiria mais montanhas, nadaria mais rios.
Iria a mais lugares onde nunca fui, tomaria
mais sorvete e menos lentilha, teria mais problemas
reais e menos imaginários.
Eu fui uma dessas pessoas que viveram sensata e produtivamente
cada minuto da sua vida; claro que tive momentos de alegria.
Mas, se pudesse voltar atrás, trataria de ter
somente bons momentos.
Porque, se não sabem, disso é feito a vida: só de momentos;
não perca o agora.
Eu era um desses que nunca ia a parte alguma sem um termômetro,
uma bolsa de água quente, um guarda-chuva e um paraquedas.
Se voltasse a viver, viajaria mais leve.
Se eu pudesse voltar a viver, começaria a andar descalço no começo
da primavera a continuaria assim até o fim do outono.
Daria mais voltas na minha rua, contemplaria mais amanheceres
e brincaria com mais crianças, se tivesse outra vez uma vida pela frente.
Mas, já viram, tenho 85 anos e sei que estou morrendo.


Ilustração: I'd pick more daisies...(after Nadine Stair), 2006. Oil and Acrylic on Canvas 90cm x 120cm. Caroline Evans Paintings.www.carolineevanspaintings.com/.../1219347.jpg