Um centão é uma composição poética (ou musical) elaborada com versos de vários autores ou de apenas um autor, assim como diz o nome: “manta de retalhos”, que vem do latim “cento”. A origem do centão é greco-latina: o poeta de então clamava por poemas homéricos e virgilianos como ponto de partida para construção de seu centão. No caso de Bandeira, o poema “Antologia” é um centão com seus versos.
Certa noite, resolvi me dedicar ao centão e procurei a origem de verso por verso, todos pertencentes a poemas memoráveis de Manuel Bandeira. Primeiramente seria maravilhoso sentir “Antologia”, perfeito como se sua feitura não tivesse nada de uma “colcha de retalhos”: fruto da magia do mestre.
Depois coloquei todos os poemas, evidenciando qual verso foi retirado para a composição do centão. Não repitirei, ficaria longo. Mas a necessidade de uma leitura dos versos de Bandeira resulta na repetição, mais uma vez, do poema que guarda, digamos, um resumo.
ANTOLOGIA
------------Manuel Bandeira
A vida
Com cada coisa em seu lugar
Não vale a pena e a dor de ser vivida.
Os corpos se entendem mas as almas não.
A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
Vou-me embora p’ra Pasárgada!
Aqui não sou feliz.
Quero esquecer tudo:
— A dor de ser homem...
Este anseio infinito e vão
De possuir o que me possui.
Quero descansar
Humildemente pensando na vida e nas mulheres que amei...
Na vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Quero descansar.
Morrer.
Morrer de corpo e alma.
Completamente.
(Todas as manhãs o aeroporto em frente me dá lições de partir.)
Quando a Indesejada das gentes chegar
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa.
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.
O título da postagem está entre aspas porque se trata de um verso de Carlos Drummond de Andrade: "Ontem, hoje, amanhã: a vida inteira,/ teu nome é para nós, Manuel, bandeira".