terça-feira, 28 de abril de 2009

A TRILOGIA BRASIL DE ANTÔNIO TORRES



Gerana Damulakis




Sou repetitiva, talvez seja uma espécie de TOC, mas o certo é que sempre volto a falar, a escrever, a discutir sobre determinados escritores, apesar do meu outro lado, ou seja, o que adora buscar, encontrar e admirar novos autores. Há, no entanto, os que sentam em cadeira cativa. A minha relação com a literatura criou uma ponte que chega, sem dúvida, ao coração. Então, só por conta do encontro de sábado com Antônio Torres, escritor que tem a minha admiração e o meu afeto, volto a escrever sobre seu mais recente romance, Pelo fundo da agulha.
Pelo fundo da agulha (Record, 2006) vem fechar a trilogia iniciada com o romance Essa terra, de 1976, hoje já definitivamente consagrado com várias reedições e traduções. Passados 20 anos surgiu O cachorro e o lobo, retomando a vida do personagem Totonhim numa volta ao sertão, partindo de São Paulo, para onde fora no final de Essa terra.
No total são 30 anos, de Essa terra até Pelo fundo da agulha, de Totonhim menino e rapaz, que deixa o Junco baiano — hoje Sátiro Dias — rumo a São Paulo, até o bancário aposentado Antão Filho, ou seja, o idoso Totonhim. Tantas foram as tragédias: a ida do irmão Nelo em busca do sul maravilha e sua volta de malas vazias e seu suicídio como redenção pelo pecado de não ter vencido; a loucura da mãe com a perda do filho; a solidão do pai; a viagem de Totonhim, também para fazer uma vida fora do sertão; o retorno de Totonhim, apenas como uma visita, mas que faz o pai temer mais um suicídio; a constatação da velhice da mãe que, apesar da vida sofrida e de uma insanidade temporária, ainda é capaz de enfiar a linha pelo buraco de uma agulha. Mas Totonhim não é Nelo, não há sina registrada e, então, vem o retorno que se dá como quem passa a vida a limpo: em São Paulo, deitado, o aposentado vai relembrando. Separado da mulher e dos filhos, conta com uma vida inteira que, enfim, pode receber um ponto final.
Pelo fundo da agulha já encontra o personagem assim, com a vida feita e refazendo o caminho através da memória, pois chega a hora de, sem sair do lugar, passar os fatos e as sensações pelo túnel do tempo. O romance leva o leitor nessa viagem de uma forma tão envolvente que, se este mesmo leitor não tiver lido Essa terra e O cachorro e o lobo, seguramente irá em busca deles. É irresistível, inclusive, uma releitura dos livros anteriores, pois queremos mais, sempre mais, após fechar o volume Pelo fundo da agulha.